As universidades têm uma função social importante: além de produzirem conhecimento, assumem uma posição de liderança nas comunidades em que estão inseridas. Um exemplo da execução desse papel no âmbito da Unesp foi reconhecido na última quarta-feira, 16 de junho, pelo Observatório de Cooperação Cidade-Universidade (OCC-U) da Associação de Universidades Grupo Montevideo (AUGM), uma rede formada por universidades públicas de seis países sul-americanos (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai).
O projeto de um Sistema de Informação Geográfica (SIG) para apoio ao Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) da cidade de Rio Claro, localizada a 173 quilômetros da capital paulista, recebeu uma certificação do observatório OCC-U que o distingue como “boa prática” para inovação e trabalho colaborativo entre universidades públicas e governos locais. A iniciativa, coordenada pela professora Maria Isabel Castreghini de Freitas, do Instituto de Geociências e Ciências Exatas (IGCE-Unesp), usou ferramentas computacionais para mapear ocorrências para as quais o Samu era acionado. Os dados coletados foram colocados à disposição do próprio Samu e também do poder público, de forma a induzir melhorias no planejamento urbano e orientar políticas públicas.
“Acredito que a pesquisa de base é fundamental e traz o desenvolvimento científico e tecnológico de que qualquer país emergente necessita, mas é na pesquisa aplicada que nos aproximamos efetivamente da comunidade, dando solução para problemas do cotidiano”, afirma a professora Maria Isabel Castreghini de Freitas, que participa de um grupo de pesquisa sobre geotecnologias e cartografia aplicados à geografia.
O estudo da Unesp em Rio Claro, que durou de 2013 a 2015, sistematizou dados de atendimentos do Samu tais como a espacialização de traumas relativos a ferimentos por arma de fogo (FAF), ferimentos por arma branca (FAB) e ferimentos por agressões (FA), ocorrências de 2011 a 2014 relacionadas à violência urbana. E fez o mesmo com atendimentos de acidentes envolvendo ciclistas e pedestres no município em 2013. As informações coletadas foram integradas aos dados censitários do IBGE (Censo de 2010). A partir da espacialização dessas ocorrências, foram elaborados mapas temáticos que permitiram visualizar a distribuição geográfica desses eventos. Ao final do projeto, foi oferecido um curso de capacitação a funcionários da equipe do Samu de Rio Claro.
“(Isso) permitiu que conhecessem na prática tudo o que a equipe de universitários desenvolveu ao longo do projeto, desde a coleta até o processamento e apresentação dos resultados, uma semente para sua autonomia na condução dos trabalhos de forma independente da universidade”, diz a docente Maria Isabel Castreghini de Freitas.
O Samu, serviço que atende nacionalmente pelo telefone 192, é administrado pelas prefeituras, com recursos do Sistema Único de Saúde (SUS). Delimitar áreas de maior ocorrência de certos tipos de eventos pode colaborar com o planejamento da rotina de trabalho da equipe do Samu e, em última instância, pode apoiar as prefeituras em políticas de segurança pública, saúde, educação, mobilidade urbana, entre outras.
Na cerimônia do último dia 16, além da iniciativa da Unesp, o Observatório de Cooperação Cidade-Universidade (OCC-U) da AUGM reconheceu projetos de cooperação com governos locais realizados por outras universidades brasileiras, como a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Para a docente da Unesp, a interação com o poder público ofereceu grande aprendizado aos estudantes envolvidos na iniciativa. “A vivência no ambiente do Samu, acompanhar o estresse daqueles profissionais que, via de regra, estão expostos a situações-limite, trabalham em turnos e de forma muito intensa, quase sem tempo para refletir sobre suas práticas, faz com que o estudante universitário vivencie outras realidades bem diferentes do seu ambiente”, relata Maria Isabel Castreghini de Freitas.
O projeto da Unesp surgiu em 2013 a partir de uma ideia de dois estudantes da pós-graduação em Geografia do IGCE, Kleber Carvalho Lima e Silas Nogueira, durante a disciplina de Sistema de Informação Geográfica (SIG). Graduado em geografia pela Universidade Estadual de Feira de Santana, Kleber tinha contato com o Samu da cidade baiana e sabia que os dados eram armazenados, na época, sem apoio de um sistema computacional. Foi assim que os pós-graduandos se propuseram a montar um banco de dados e realizar um curso de formação naquele município. Diante dos bons resultados dessa aplicação na Bahia, a docente da Unesp procurou o Samu de Rio Claro para estabelecer a parceria. “Na época, a coordenadora Alcione foi muito receptiva e abriu seus arquivos e o espaço físico do Samu para receber nossos estagiários”, recorda a professora.
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