O Centenário entrevistou a presidente da Comissão do Direito do Trabalho da OAB Rio Claro, a advogada Sandra Maria dos Santos Mendonça, que falou sobre a importância do direito trabalhista para a sociedade, citou as principais mudanças da reforma trabalhista, aprovadas no governo de Michel Temer (MDB), e enfatizou que defende a manutenção do direito trabalhista por considerar que “todo empregado tem direito em receber sua contraprestação pelo trabalho de forma digna”. Veja trechos da entrevista.
l Qual a importância do Direito Trabalhista para a sociedade?
O Direito do Trabalho é de extrema importância para a sociedade, à medida em que impede que o cidadão tenha seus direitos violados enquanto trabalhador e atualmente também enquanto empregador. Promove o equilíbrio ausente na relação de trabalho. É um conjunto formado de princípios e regras que visam assegurar melhores condições de trabalho, inclusive sociais, ao trabalhador, através das medidas de proteção a eles destinadas.
l Quais foram as principais mudanças na reforma trabalhista e como impactou o trabalhador?
A reforma trabalhista veio a alterar mais de 100 pontos da Consolidação da Lei do Trabalho. Um dos principais pontos alterados é a validade dos acordos entre patrão e empregado. Especificamente sobre a Justiça do Trabalho, as mudanças delimitam que as ações que ficarem paralisadas na fase de execução por mais de dois anos, serão extintas. Impactou o trabalhador porque também define punições a quem ingressar com ação por má-fé, além de obrigar o perdedor a pagar as custas processuais. Contudo, o empregado postulando na Justiça apenas as verbas que lhes são devidas e de direito, não corre o mesmo o risco de arcar com os pagamentos das custas processuais acima referidas.
l A reforma, na sua opinião, foi positiva?
Na minha opinião, embora alguns tópicos sejam considerados benéficos para os trabalhadores, vários outros são prejudiciais e representam retrocesso, tais como:
Fim da assistência gratuita na rescisão do contrato de trabalho: como não há mais a necessidade da rescisão do contrato de trabalho ser homologada no sindicato ou no Ministério do Trabalho, o trabalhador perde a assistência gratuita que verificava se as verbas pagas pelo empregador nas rescisões estavam corretas.
Autorização da dispensa coletiva sem intervenção sindical: até então, a maior parte dos tribunais trabalhistas vinha entendendo que a demissão coletiva somente poderia ocorrer após feita uma negociação entre a empresa e o sindicato dos trabalhadores para atenuar as consequências das rescisões, já que, diante do número de afetados, a dispensa coletiva costuma ter grande impacto social. Com a reforma, a dispensa coletiva pode ser realizada nos mesmos moldes da individual, ou seja, sem negociação com o sindicato e sem medidas que atenuem seu impacto na sociedade.
Restrição de acesso à Justiça gratuita: só terá acesso gratuito à justiça trabalhista quem receber salário igual ou inferior a 40% do teto do INSS. Vale destacar que um processo judicial tem custos que devem ser arcados pela parte perdedora.
Permissão para negociação coletiva de condições menos benéficas ao trabalhador do que as previstas em lei: foram ampliadas as matérias que podem ser objeto de negociação coletiva, sendo possível, inclusive, que sejam estipuladas condições mais prejudiciais ao trabalhador do que aquelas previstas em lei. Por exemplo, a prorrogação da jornada de trabalho em ambiente insalubre somente era possível mediante autorização do Ministério do Trabalho. Com a reforma, basta que essa prorrogação seja prevista em norma coletiva.
Horas extras sem pagamento em “home office”: o atual entendimento da maior parte dos tribunais trabalhistas é que mesmo o trabalho praticado em ‘home office’ deve ter a jornada controlada, desde que os meios tecnológicos permitam isso. A reforma, porém, exclui esse trabalhador do controle de jornada, o que, na prática, pode significar a realização de trabalho superior ao limite legal sem recebimento de horas extras.
l Quais são as principais causas procuradas pelo trabalhador no direito trabalhista?
Descumprimento de Convenção Coletiva do Trabalho, falta de pagamento das verbas rescisórias na integralidade, quando de sua demissão, e falta de depósito a título de FGTS .
l Em sua opinião, o direito trabalhista tem que ser aprimorado?
R. Sim, tem muito a ser aprimorado ainda, especialmente quanto à importância dos sindicatos das classes dos Trabalhadores, pois como explanado acima, alguns tópicos com a reforma trabalhista representam um retrocesso da Justiça do Trabalho.
l Alguns setores da sociedade defendem o fim dos direitos trabalhistas por considerarem que são prejudiciais ao mercado. Como a senhora avalia esse pensamento?
Não concordo com este pensamento. Todo empregado tem direito em receber sua contraprestação pelo trabalho de forma digna, bem como perceber salários compatíveis para que possa garantir uma vida saudável a ele e sua família.