Coitado de Jesus! Primeiro, o crucificaram inteiro: da cabeça aos pés. Integralmente. Ao longo da história, e hoje também, fizeram e continuaram fazendo picadinho de Jesus. O devocionismo popular foi retalhando Jesus: é devoção às “Mãos Ensanguentadas de Jesus”, devoção à “Chaga do Ombro Esquerdo”, devoção à “Chaga do Ombro Direito”, devoção à “Cabeça de Jesus”, devoção aos “Pés Chagados de Jesus”, devoção à “Sagrada Face”, pasmem, até devoção ao santo umbigo e ao “Santo Prepúcio” de Jesus. Não deixaram nada de fora.
Tá estranhando? A devoção ao “Santo Prepúcio e ao Sagrado Umbigo” são das mais antigas para os católicos. Diz-se que lá pelos anos 1305 a 1314, o Papa Clemente V dividiu o cordão umbilical atribuído a Jesus em três pedaços: deu um para Constantinopla, outro para a Basílica de São João de Latrão e um terceiro para a Catedral de Notre Dame . Porém, outras igrejas possuem cordões de Jesus inteirinhos. Tanta piedade e devoção levou Voltaire, no seu humanismo, a defender o direito às crenças, por mais estapafúrdias que parecessem: “Não saltará aos olhos que ainda seria mais louvável adorar o Santo Umbigo e o Santo Prepúcio, do que execrar e perseguir o nosso irmão?”
Por falar em Santo Prepúcio, aquela pele ou glande que cobre o pênis, outra bizarrice: pela tradição, esse anel de carne, retirado do membro de Jesus não se perdeu. Ainda anda por aí em 2018, multiplicando-se.
O Sagrado Prepúcio de Jesus é uma das mais antigas e valiosas relíquias cristãs relacionadas à pessoa de Jesus. No século XVI, o Papa Clemente VII, declarou que o prepúcio de Jesus era uma relíquia autêntica e fruto do corpo de Jesus. O hilário, nem tanto, foi a esperteza desse Papa que, sob o pretexto de incentivar a devoção e a piedade, aplicou no sagrado Prepúcio um “business plain” bem malandro: concedeu indulgência aos peregrinos que viessem prestar homenagens e, assim, estimular outros negócios.
Aliás, por detrás de cada devoção existe sempre um “business plain”, a ponto de poder se perguntar: em termos de mercado, quanto vale, hoje, Jesus?! É possível fazer uma leitura monetária de Jesus?! Dar razão a Al Gore quando afirma que “onde está a contabilidade aí esta Jesus”?!
Alguém do mercado financeiro poderia calcular o quanto se arrecada com a “Sagrada Face de Jesus”, com as “Mãos ensanguentadas de Jesus”, com a devoção à Chaga do Ombro Esquerdo de Jesus, com a dor do Ombro Direito, com as Chagas da mão esquerda e direita de Jesus, até com o Santo Prepúcio e o Santo Umbigo. Certamente Jesus estará entre os produtos mais cobiçados do mercado. Se ainda acrescentarmos os dízimos e ofertas que “asseguram a salvação”, os shoppings católicos e evangélicos ao redor de cada subproduto religioso, tipo Bíblias, livrinhos de novenas, receituários de curas em nome de Jesus, bótons, camisetas, medalhas, imagens, frasquinhos de água benta ou do Rio Jordão, fitinhas protetoras e tantas outras, Jesus, sem duvida, é um produto de primeira linha nos mercados nacionais e internacionais. Otário foi Judas que o vendeu por apenas trinta moedas.
Tudo bem: não existe almoço nem jantar de graça. Até um simples cafézinho. Tudo tem seu preço. A devoção também. Mas ao fazer picadinho de Jesus, onde cada pedacinho tem seu rendimento, qual é a imagem de Jesus que se fixa na mente e no coração do devoto?! Quando o devoto se fixa nas “Mãos Ensanguentadas de Jesus”, ou na Sagrada Face, como é fica o Jesus pessoa, inteiro, completo, como o revelam os Evangelhos?
Cruz, credo! Isso parece ser caricatura e até blasfêmia. Que me perdoe o Santo Prepúcio de quem eu sou um grande devoto, junto a tantas mulheres que a ele recorrem para melhor desempenho de seus maridos! E-mail otto.dana@gmail.com.
Por Pe. Otto Dana