Bom dia, madames e my lordes! Que calorzão, danado heim! Vamos de suquinho de laranja, nesta manhã, que apenas inicia. Salve 2021, e que nos traga alegrias!
Estava eu confabulando ontem com meu amigo Nestório e cheguei à conclusão de que a Língua Portuguesa, nascida do latim vulgar, que era por sinal, muito pobre, foi certamente concebida por quem não tinha muito o que fazer. Só pode. Porque vejam. Para o verbo “fazer” na Língua Portuguesa, são 59 conjugações possíveis, as quais, para a boa paciência do leitor me recuso a reproduzi-las aqui. Já na Língua Inglesa são apenas 5: Do, does, doing, did, done. Inglês, de fato, é um sujeito esperto: prático e objetivo.
Estávamos eu e Nestório, a falarmos sobre livros, quando, em dado momento, eu disse a ele: Escrever todos podem, meu caro. Escrever bem, contudo, é um trabalho como qualquer outro. É como um serviço de carpintaria, arquitetura, marcenaria. É como esculpir o barro, a argila até obter a forma desejada e apreciável aos olhos mais exigentes. É como erigir como os pedreiros livres, as grandes catedrais do passado, com a geometria sagrada acessível a poucos. É cavar nas entranhas do solo, como faz o mineiro, na esperança de chegar ao veio das pedras preciosas, do ouro reluzente de valor inestimável. Escrever bem é um ofício sacramental, a comunhão com o grande artífice do universo. E nessa jornada difícil, que poucos suportam, percorre-se como o aprendiz, um caminho longo, sinuoso e escuro, até chegar ao final do caminho perigoso e incerto, e encontrar a luz. E, então, humildemente, compartilhar a luz com aqueles que sabem compreendê-la e respeitá-la.
Enquanto tomava o delicioso cafezinho, de cada manhã, indispensável para o seu bom ânimo, ele me olhou um tanto surpreso, por baixo dos óculos que insistiam cair-lhe sobre o nariz, toda vez que algum assunto lhe causasse preocupação. Não disse nada, deu-me um tapinha no ombro e voltou à leitura do seu Diário.
Durante muito tempo, pra ser exato, desde a minha adolescência, assistia a filmes que me impressionavam muito e os tomava para mim como que referências incontestáveis e verdades absolutas. Foi assim com O Poderoso Chefão. E foi também com Era Uma Vez no Oeste, Os Miseráveis e alguns outros filmes. O mesmo se deu com livros como: Não Verás País Nenhum de Inácio Loyola Brandão, Angústia de Graciliano Ramos, O Estrangeiro de Albert Camus, O Grande Gatsby de Scott Fitzgerald e O Sol Também se Levanta de Ernest Hemingway. Mas a maturidade que só as experiências vividas na pele nos proporciona me demonstrou com o tempo de que as coisas não são exatamente como nos sugerem os livros e os filmes.
É temerário, a meu ver, formar conceitos e opiniões, sobre os mais diversos assuntos de interesse humano, baseados apenas em livros e filmes. Mas essa parece ser uma tendência desses nossos tempos. O agravante disso é que a média intelectual do ser humano da atualidade, salvo raras exceções, não é lá grande coisa, devido ao processo de emburrecimento que tem sido imposto a todas as nações, sobretudo, do mundo ocidental, nos últimos 50 anos, com a disseminação de uma arte e uma cultura terrivelmente pobre, chula, consumível na mesma velocidade que é descartável.
É através dessa cultura e dessa arte pobre, que se vendem verdades que não se sustentam ao crivo da razão, mas que vão, aos poucos, moldando o comportamento e a conduta ética da sociedade humana, tornando-a submissa e escrava de um sistema que a consome, de dentro para fora. Uma sociedade burra e descrente de si mesma, interessa àqueles que, de fato, mandam no mundo. E não me refiro aos governantes.
Enfim, dissabores à parte, resta dizer que, nos primeiros dias de cada ano, é natural que a gente sinta saudade daqueles que partiram deste mundo antes de nós. Poder ouvi-los, tocá-los, vê-los e interagir com esses entes queridos, se torna uma necessidade, à qual, naturalmente, não podemos satisfazer.
Mas, lembremos que a essência da vida humana e, portanto, espiritual, está na individualidade, e no pensar e no sentir, duas capacidades, comuns a todos, independentemente da condição moral e intelectual do momento.
Portanto, sintamos saudades, sim, mas também amor por aqueles que já concluíram o ciclo da vida humana. E pensemos neles de maneira alegre, bonita, sem mágoas ou remorsos, desejando sempre, o melhor para eles. O que oferecermos e o que desejarmos, a quem quer que seja, teremos de volta.
Agora, com a sua licença, leitor, me deu vontade de tomar um café. Vamos?