“Ele me agrediu, me deu um soco na cara. Sem dó, sem piedade bateu em mim com uma barra de ferro na cabeça”, conta uma das vítimas de violência doméstica atendidas pela Patrulha Maria da Penha da Guarda Municipal de Rio Claro que somente neste ano, de janeiro a maio, já registrou 200 atendimentos.
Aos 45 anos, a vítima – que manteremos a identidade preservada – relatou quando começaram as agressões até chegar na assistência do serviço da Patrulha Maria da Penha. Ela viveu por 14 anos com o companheiro que, no início, como a maioria dos homens demonstra, era tranquilo. Segundo a mulher, o relacionamento era bom, mas o agressor já consumia bebidas alcoólicas em excesso, o que aumentou ainda mais com o passar dos anos. “Cada ano que passava foi piorando, com o tempo vieram as agressões, gritava, xingava palavrões que é bom nem lembrar. Depois vieram as agressões físicas”, relata.
Após as agressões, vinham os pedidos de perdão e as promessas de que mudaria. Ela tentou separar, ele pediu para ser internado e se tratar, mas saiu antes do tratamento terminar e voltou a procurá-la.
E foi no dia 20 de fevereiro de 2021 que ela viu a morte de perto. “Ele tinha sumido um tempo, não ligava mais e apareceu. Eu com dó abri o portão, tentei conversar, ele desconfiado de mim, porque eu disse que não queria mais voltar, ele achava que eu tinha outro. Estávamos conversando no portão, meu celular tocou, ele catou e saiu correndo, eu fui atrás, e numa rua perto da minha casa, ele me agrediu, deu um soco na minha cara que me derrubou, fui tentar me levantar, mas ele já me puxou pelos cabelos, me arrastou; no jardim tinha uma barra de ferro, ele catou e me bateu na cabeça. Fiquei desacordada”, relata a vítima que foi socorrida pela filha, levada para atendimento médico, registrou a ocorrência e recebeu a Medida Protetiva.
Mesmo com a decisão judicial para se manter distante, o agressor não respeitou. “Ele voltou atrás de mim, passava em frente ao meu trabalho, me coagia, eu tinha medo dele, ainda tenho, não respeitava a Medida Protetiva. Aí no dia 24 de maio ele tentou invadir minha casa, precisei chamar a Patrulha Maria da Penha da GCM, ele fugiu, em outro dia chamei de novo e conseguiram prendê-lo”, conta.
Contudo, o medo ainda toma conta da mulher que fica abalada ao relembrar as agressões que viveu. “Tenho medo, está preso, mas não sei o pensamento dele quando sair. Eu já me informei sobre a Medida Protetiva se é válida e é, busquei muitas informações com as equipes, porque estou com medo, preciso mais do que nunca desta Medida Protetiva.”
A mulher relata que após a prisão do agressor continua recebendo a assistência das equipes. “Depois disso eu já recebi a visita da Patrulha Maria da Penha em casa, sempre me dando apoio, me ligaram muitas vezes perguntando como eu estava, se precisava de alguma ajuda, estão sempre me dando assistência. Essa semana mesmo fizeram visita, estão presentes”, enfatiza a vítima que, com o depoimento pretende ajudar outras mulheres que enfrentam a mesma situação. “Eu tenho sido grata a esse serviço e a esse apoio. Eu não imaginava que era assim. Eu me sinto mais segura, sim, porque eu sei que posso contar com a Patrulha, porque toda vez que precisei chamar foi muito rápido, foram muito prestativos”, ressalva.
PRESO POR TENTATIVA DE FEMINICÍDIO
“Não fui morta porque consegui sair correndo e com auxílio de vizinhos foi acionado o Samu”, mesmo ferida, uma outra vítima conseguiu fugir e relatar o que havia acontecido. A tentativa de feminicídio foi registrada na madrugada de segunda-feira, 25 de maio de 2021, no bairro Bonsucesso em Rio Claro. Era por volta das 2 horas quando a equipe da viatura 742 da Guarda Municipal foi acionada a dar apoio ao Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU).
Na residência da vítima ACMF, ela informou que passou a tarde na casa de seu ex-companheiro AES e que o informou que não queria mais contato com ele. Retornou a sua residência, onde reside com um outro homem e seu filho de 7 anos.
Na madrugada, estava deitada na cama com seu atual companheiro, quando AES rompeu a porta da entrada principal, entrou no imóvel e a encontrou, desferindo um golpe com uma faca de cozinha, que a atingiu na região abdominal causando uma lesão aparentemente profunda. ACMF informou ainda que só não foi morta porque conseguiu sair correndo e com auxílio de vizinhos foi acionado o SAMU. A vítima informou ainda que o ex-marido fugiu para a casa que reside, próximo ao local dos fatos.
A equipe da viatura se dirigiu até o imóvel onde encontrou AES que confessou ter esfaqueado sua ex-companheira e que a intenção era matá-la, pois não quer vê-la vivendo com outro homem. Informou que chegou em casa e lavou a faca, pois estava com manchas de sangue da vítima, e mostrou onde estava a arma branca. A vítima foi socorrida até a UPA da 29 e em seguida transferida para o PSMI da Santa Casa, onde passaria por cirurgia. O autor da tentativa de feminicídio foi preso e permaneceu à disposição da justiça.
PATRULHA MARIA DA PENHA
A Patrulha Maria da Penha da Guarda Municipal foi criada em dezembro de 2018, em Rio Claro, para que as mulheres vítimas de violência que possuem medida protetiva recebam visitas periódicas e acompanhamento da Guarda Civil, que verifica se as determinações da Justiça estão sendo cumpridas.
NOVO DISPOSITIVO
Além da viatura e dos cursos de capacitação das equipes, durante a pandemia em que os casos de violência doméstica aumentaram em todo o país, foi pensada em uma alternativa para que as vítimas pudessem ter uma forma de acionamento mais rápido, todas contam com WhatsApp da Patrulha Maria da Penha. “Os contatos são, na grande maioria, por telefone. Depois da pandemia foi priorizada essa alternativa para a segurança tanto da vítima, como das guardas, mas sempre mantendo o patrulhamento nas proximidades das residências das mesmas. Também por conta da pandemia, muitas vítimas pela situação financeira acabaram ficando sem telefone e o contato precisou ser presencial, nesse caso, sempre tomando todas as medidas de segurança, os contatos são feitos pessoalmente”, explica Luciana Cristina da Mota Rodrigues, que é Guarda Municipal há 14 anos, hoje atua no setor administrativo, contudo esteve à frente dos trabalhos desde a implantação da Patrulha no município.
“Desde o início, fomos atrás pra conhecer locais onde a patrulha já atuava, fiz contato com Suzano para podermos fazer a capacitação, onde eu e mais três guardas fizemos o curso e fomos multiplicadores passando os conhecimentos adquiridos à toda a corporação”, menciona ao destacar a importância de todos estarem capacitados, visto que, diante da necessidade, caso a viatura da Patrulha esteja em atendimento ou alguma visita, qualquer outra viatura precisa estar capacitada para dar esse primeiro atendimento. Posteriormente, a patrulha passa a fazer o acompanhamento.
Após a implantação, o serviço em Rio Claro também passou a ser referência. “Depois de já estarmos atuando, fomos procurados por diversas guardas que quiseram conhecer nosso trabalho. Fizemos a capacitação de uma Guarda da região. Aos poucos, fomos sendo reconhecidos e fazendo várias parcerias que são primordiais para esse trabalho, como a DDM, o Creas, Conselho Tutelar, Caps, Anexo da Violência Doméstica, Fundo Social, Lar Esperidião. São diversos locais que sempre nos ajudam e nós também auxiliamos sempre que somos solicitados”, destaca como essencial a integração de outros órgãos.
OUTRAS AÇÕES
O Anexo de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher foi implantado na cidade de Rio Claro. O serviço judiciário foi instalado pelo Tribunal de Justiça e teve o início das atividades em parceria com a prefeitura que cedeu os funcionários, em 28 de junho de 2019. Pelo anexo passam todos os casos de violência contra a mulher da comarca, a unidade judiciária se tornou importante no combate a este tipo de violência, visando agilizar o atendimento que já era realizado, que na época em que foi anunciado, eram aproximadamente 1.500 processos envolvendo todos os casos de violência doméstica na Comarca de Rio Claro, distribuídos nas três varas criminais e o objetivo era exatamente acelerar esses processos que aguardavam decisões no Fórum.
No dia 12 de abril de 2017, a Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) “Dra. Liana Mungai” passou a contar com instalações próprias novamente para o atendimento mais adequado das vítimas e desde então segue em funcionamento. Antes, a DDM funcionava em outro imóvel, o que ocorreu até 2010, em outubro daquele ano foi fechada com a implantação do projeto de reengenharia da Polícia Civil, que aglutinou as delegacias em um mesmo local. Porém, diversos setores e autoridades iniciaram o processo de reabertura da DDM.
A implantação de uma Casa de Acolhimento para mulheres vítimas de violência doméstica é estudada, o secretário de segurança de Rio Claro Otávio Balbão Júnior, diz que a proposta é viável. “Pretendemos fundar uma casa de primeiros auxílios para essas mulheres vítimas, envolver a ação social, outros departamentos da prefeitura, outras secretarias, que possamos dar esse primeiro acolhimento a ela, um encaminhamento, ela merece uma especial atenção, então, pretendemos implantar isso, tem que ser para o próximo ano, fazer isso logo, uma ação muito importante essa Casa de Acolhimento, que tem apenas em algumas cidade grandes. É possível para nós. Temos uma relação de todas as mulheres que estão sob medidas protetivas e a equipe passa auxiliando constantemente. Elas têm o WhatsApp da guarda, em caso de urgência em que o agressor se aproxima, a vítima prontamente consegue acionar a equipe e contamos agora também com uma assistente social na sede da guarda para atender às mulheres”, observou.
ATENDIMENTOS
Em 2020, a Patrulha Maria da Penha realizou 817 atendimentos e desses, 229 foram registrados R.O. (Relatório de Ocorrência). Somente neste ano de janeiro até maio foram realizados 200 atendimentos pela Patrulha Maria da Penha, dos quais 80 deles foram registrados R.O. (Relatório de Ocorrência).
Além dos atendimentos de ocorrências, a Patrulha Maria da Penha realiza diversos contatos com as vítimas, tanto presencialmente como por telefone, para saber a situação em que a vítima se encontra, e se certificar de que a Medida Protetiva está sendo cumprida.
AGRESSÃO
“Ele me agrediu, me deu um soco na cara. Sem dó sem piedade bateu em mim com uma barra de ferrou na cabeça.”
MEDIDA PROTETIVA
“Eu achava que tudo ia acabar, as promessas vinham, as desculpas também, até que não deu mais, hoje tenho Medida Protetiva e assistência da Patrulha Maria da Penha.”
WHATSAPP EXCLUSIVO
Patrulha Maria da Penha da Guarda Municipal conta com um WhatsApp exclusivo para contato com as mulheres atendidas que podem fazer o acionamento a qualquer hora caso se sintam ameaçadas. O número é disponibilizado apenas para as vítimas.
Por Janaina Moro/Vivian Guilherme / Foto: Divulgação