Alguns de nós, não todos, só os mais sensíveis, sofrem com a consciência de ter perdido a ingenuidade. Angustiados, sofremos também por não enxergar essa mesma sensibilidade nos outros. Vestidos com nossa camada de pele mais superficial vamos fingindo ser nós mesmos. É uma defesa possível, necessária muitas vezes.
Vivemos pressionados pela vida e pelas exigências cada vez mais intensas do espetáculo, que hoje permeia as entranhas das pessoas mais anônimas, por meio das redes sociais. Como matéria escura que invade aos poucos uma existência comum, iluminada.
Quase todo mundo trocou seus amigos por um público. Passivo em sua subjetividade, essa plateia sempre parece estar pronta para os likes automáticos, e exige sempre mais, mais e mais.
É um espetáculo bizarramente pessoalizado, no nível mais fundamental. Muitos amam só a imagem, a casca, o que há de mais imediato, e agora estão cegos demais para olhar para dentro de si.
E a superexposição de uma falsa felicidade esconde a amargura de um vazio existencial. Mantendo a plateia de seguidores sempre alimentada, com seus likes robóticos, muito se iludem em sua vida de tarefas programadas.
O like importa, ainda que a vida seja secretamente insatisfatória. Muita gente voluntariamente assume o papel do palhaço do circo, que obrigatoriamente deve estar alegre e fazer rir naquele curto momento do picadeiro, mesmo que seja triste fora dele. A diferença é que o palhaço é artista, profissional.
Alguns de nós, só os mais sensíveis, já estão fartos do mundo ao seu redor. Clamando por uma transformação, algo que eleve a esperança de mudança, não um despertar coletivo mas um tempo de maior delicadeza, de mais respeito e poesia.
Um mundo onde haja menos gente cheia de certezas. Por redes sociais mais afetivas, e menos pessoas com opiniões infundadas com suas imposturas, querendo palpitar em coisas que não entendem minimamente.
No mais, alguns de nós, os mais sensíveis, envelhecem, e precisam se acostumar ao que Sartre bem dizia: “Eu sei que nunca mais encontrarei nada nem ninguém que inspire uma paixão. É preciso ter uma energia, uma generosidade, uma cegueira. Há até um momento, bem no início, em que é preciso saltar por cima de um precipício: se refletirmos, não o fazemos. Sei que nunca mais saltarei…”
A propósito, quando foi a última vez que você se apaixonou?
Mas, olha o que eu estou dizendo, bobagem né? Afinal o show tem que continuar. Não há mais tempo para o que há de mais humano em nós.
Perdemos para o espetáculo.