No mês anterior, dia 11 de março, a pandemia da Covid-19 marcou um ano de existência. No entanto, a luta contra o coronavírus ainda não acabou. Ainda entre perdas, tristezas, dificuldades na gestão da vacinação e hospitais fragilizados, a sociedade e o Estado se obrigaram desde o ano passado a realizar o ‘lockdown’ como método preventivo para desacelerar a contaminação do vírus. Com isso, do primeiro ao terceiro setor, todas as instituições foram afetadas, inclusive uma, em específico, muito conhecida por ser a busca por um conforto nestes momentos difíceis.
NEGUE-SE A SI MESMO… E CARREGUE A SUA “GANGORRA”
Ter responsabilidade para administrar a crise causada pela pandemia e ao mesmo tempo tentar manter a vida o mais normal possível é como uma “gangorra” que requer sabedoria, “às vezes resignação, às vezes paciência”, sugere Edson Montemor, Presidente do Centro Espírita Verdade e Luz, localizado na Av. 5, no bairro Consolação, em Rio Claro. “Acreditamos no direito inalienável de ir e vir, mas compreendemos a necessidade do distanciamento. Não somos favoráveis ao fechamento das instituições religiosas, mas sim à redução do número de frequentadores com as demais precauções sanitárias.” Isso porque, segundo matéria divulgada na última sexta-feira (22), o Diário veiculou que o índice de ocupação de leitos estava em 65%, com 102 pessoas em tratamento hospitalizadas e 51 pessoas na UTI, o que demonstra, ainda, a necessidade do distanciamento social e cuidados preventivos.
Segundo Edson, o público presencial das reuniões diminuiu, é claro. Mas o líder religioso entende que “por hora, é bom que seja assim para atendermos às regras sanitárias”. “Por outro lado, percebemos que novas pessoas buscam o consolo que a doutrina oferece”, complementa. A troca das palestras presenciais pelas virtuais, em virtude das leis de restrição, acabaram se tornando uma via mais fácil até mesmo para visitantes, inclusive, “de outros credos que, normalmente, não entrariam num Centro Espírita”, nas palavras do presidente do centro. “Assim que pudemos voltar a atender presencialmente, o fizemos, mas na segunda onda voltamos a fechar, mantendo sempre o atendimento de modo virtual. Sentimos uma diferença. Cada vez mais habituados com a tecnologia, temos conseguido chegar a públicos cada vez maiores e mais ecléticos.”
SER OU NÃO SER, COMO FAZER? EIS A NOVA QUESTÃO
O Centro Espírita Verdade e Luz não foi o único a sentir os impactos da nova pandemia, que têm causado, além de uma espécie de destruição em massa das vidas humanas, transformações no ambiente religioso.
Em seus 33 anos de caminhada de vida como formando e presbítero da Igreja Católica, o Padre Renato Luís Andreato confessou ao Diário que nos primeiros momentos da pandemia, em 2020, se sentiu impotente. “Houve certo desconforto, pois tudo foi inesperado. Algo com o qual nossa Igreja nunca havia se deparado, assim como, toda a sociedade. Tivemos de aprender a lidar com o novo jeito de ser Igreja”, conta. A “Igreja”, na ocasião, se trata da Paróquia Nossa Senhora Aparecida, localizada na Rua 2-A, no bairro Vila Aparecida, em Rio Claro. Segundo o padre, a forma mais “prudente” e “caritativa” de “fazer chegar a Palavra de Deus” foi usar a mídia, conforme discutido em uma reunião com os líderes da comunidade. “Assim, surgiu a proposta de dois jovens da comunidade de instalar a TV Oração e promover um aperfeiçoamento do Facebook da Paróquia Nossa Senhora Aparecida”, explica. O líder religioso ainda afirma que a “adesão dos fiéis” à nova forma de transmitir os cultos superou as expectativas da comunidade, o que motivou a buscarem mais formas de atingir um número maior de famílias e cristãos.
Depois de tudo e de todo o desconforto, o padre salientou em entrevista que a experiência o fez crescer na fé e avalia que as “celebrações estão, de forma ascendente, se fortalecendo à medida que os fiéis são vacinados e se tornam conhecedores das precauções necessárias contra esse vírus”.
“A FÉ NÃO COSTUMA FAIÁ”
Para o artista, músico e compositor Gilberto Gil, a fé não falha, como demonstra na canção ‘Andar com fé’, do álbum ‘Um Banda Um’, de 1982. E o presidente da comunidade religiosa espírita parece também não discordar do músico. “Embora o lema do Espiritismo seja ‘Fora da caridade não há salvação’, sua alma é a esperança e o consolo, a felicidade e a gratidão de estarmos nesse plano de aprendizado”, aponta Edson. Para o líder, a certeza “inabalável” de que o destino encontra-se sob supervisão do divino, como modo de aprendizado e crescimento, coloca em apaziguamento o coração dos fiéis, dando a “força necessária para consolarmos os corações mais fragilizados”. “Somos solidários às dores dos nossos irmãos”, ressalta. Edson Montemor ainda aponta a Jesus o exemplo viável para lidar com as dores dos nossos tempos.
Sem dúvida, isto não parece nem um pouco distante da personagem de Jesus Cristo de Nazaré, encontrado nas leituras bíblicas cristãs. Considerado apenas um profeta importante para alguns, para outros uma entidade divina em forma de homem, o pregador nazareno do chamado ‘Novo Testamento’ é apontado pelos seus discípulos nos evangelhos como alguém simples, que vivia entre os que sofriam com as fragilidades socioeconômicas, culturais e religiosas do seu tempo. Para o padre da igreja católica, a fé é o “princípio fundamental” para se acreditar, de modo que “para quem crê, ela se transforma em ‘verdade’”. Pensando no escritor de Hebreus, Paulo de Tarso, tratado por muitos como um dos apóstolos mais importantes da literatura religiosa, a ideia de que a ‘fé é a certeza daquilo que esperamos e a prova das coisas que não vemos’ parece caber no momento atual, no qual, como aponta Padre Renato, estamos ainda cercados pelo “descuido humano, prepotência e ambição de alguns”.
FÉ
“A fé é a certeza daquilo que esperamos e a prova das coisas que não vemos.”, apóstolo Paulo de Tarso
Por Samuel Chagas / Foto: Divulgação