O trauma pela derrota da Seleção Brasileira na Copa de 1950 em pleno Maracanã contra o Uruguai, levou o saudoso, e tão necessário atualmente, Nelson Rodrigues, a cunhar o termo “complexo de vira-lata”.
“Por ‘complexo de vira-lata’ entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo. O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem”, definiu o escritor.
Soma-se à constatação rodrigueana a inveja incurável que sentimos de quem faz sucesso, seja em que área for. “No Brasil fazer sucesso é uma ofensa pessoal”, bem dizia Tom Jobim.
São quase teoremas sobre nós, vivenciamos isso no dia a dia. Mas, afinal, o que isso tem a ver com o fato de o Brasil até hoje não ter nenhum ganhador do Prêmio Nobel? A resposta é: tudo!
Em recente entrevista ao Roda Viva, Ozires Silva conta sobre um jantar em Estocolmo com membros da Academia Sueca, do comitê que indica candidatos ao prêmio Nobel. E na ocasião, quando perguntou a eles sobre o a ausência de brasileiros entre os laureados, ouviu resposta que o envergonhou: “No Brasil vocês destroem seus herois. Basta uma indicação de um brasileiro para o prêmio que, seja por despeito ou inveja, surge uma enxurrada de críticas e difamação em cima da pessoa”, ouviu Ozires de um dos membros do comitê Nobel.
Sério candidato ao Nobel de Fisiologia em 1921, Carlos Chagas foi vítima de tamanha campanha de descrédito movida por seus pares brasileiros, que naquele ano o Nobel de Fisiologia ou Medicina não foi entregue a ninguém. E isso aconteceu com outros como Vital Brasil, Celso Furtado, César Lattes, Zilda Arns etc.
Sobretudo no campo científico, brigamos pouco por reconhecimento, nos contentamos com muito pouco, muitos cientistas geniais se escondem por trás de suas mesas em salas nos fundos de departamentos das universidades públicas, presos a burocracias e rotinas kafkianas, alguns alimentados por recalques outros por frustrações do que poderiam ter sido e não foram.
Na Física, tivemos dois exemplos emblemáticos de injustiças, o do já citado César Lattes e do Mário Schemberg. Lattes descobriu o Méson pi em 1947, não foi laureado com o prêmio Nobel de Física, mas sim Cecil Powell, que era seu chefe e não havia participado diretamente das pesquisas.
O pernambucano Mario Schenberg, foi apontado pelo próprio Einstein como um dos dez físicos mais imporantes na sua época. Schenberg descobriu como se formam as supernovas e coassinou com o Nobel de Física indiano Subramanyan Chandrasekhar uma teoria sobre o ciclo de vida das estrelas, nenhum dos feitos passou despercebido pelo comitê que concede o prêmio, mas nem assim Schenberg ganhou. E há muitos outros exemplos que não caberiam aqui.
Somos inventivos, criativos e geniais, mas não gostamos que essas qualidades sejam reconhecidas no outro. Logo brota a tal “inveja dos pares”.
Inventamos e descobrimos muitas coisas como o aeróstato, a máquina de escrever, o avião e os automóveis bicombustíveis, mas o Brasil jamais teve sua produção científica reconhecida através de um prêmio Nobel. Com todo respeito aos irmãos sul-americanos, mas dói no coração saber que Argentina, Colômbia, Chile e Venezuela, já conquistaram o seus.
Um bom exemplo, fora da Academia, é a nossa reação sempre servil aos americanos que dizem ser os irmãos Wright os pais da aviação, mesmo sem registros que o comprovem, diferentemente de nosso Santos Dumont. Eles falam, e pronto, baixamos os olhos e aceitamos bovinamente. Assim é com a invenção do rádio também, com o padre brasileiro Landell de Moura, preterido em favor do italiano Guglielmo Marconi.
Precisamos nos curar desse complexo de vira-latas e de nossa inveja endêmica. Quem sabe assim as coisas comecem a melhorar por aqui.