Numa publicação do Instagram, do dia 12 de julho, dizeres que transmitiam carinho e gratidão: “Está chegando o dia de embarcar rumo aos Jogos olímpicos e eu só tenho a agradecer”. A partir daqui, uma longa lista fazendo menção aos contribuintes para a preparação técnica do então autor da mensagem: o atleta olimpíco de taekwondo Netinho Marques – que à época estava na Sérvia, a 2 dias de embarcar para Tóquio, a sede dos jogos.
O caso, no entanto, é que entre os agraciados mencionados pelo lutador, um se encontra na foto ‘instagrâmica’ ao lado do atleta. É o lutador Matheus Carneiro. Jovem, 18 anos, são-carlense de berço, mas que veio morar em Rio Claro ainda criança, quando tinha 9 anos. A causa, segundo ele, foi uma desavença entre os genitores. Mas quem poderia dizer que uma mudança de percurso familiar o traria para a Cidade Azul, que se tornou cenário para algo que seria o seu objetivo dentro do esporte. “O meu objetivo no Taekwondo é ser medalhista mundial.”
ONDE TUDO COMEÇOU
Matheus Carneiro estudava no colégio Joaquim Salles, em Rio Claro, no turno da manhã, quando ao final do seu 7º Ano Escolar do fundamental, uma palestrante foi à escola para falar aos alunos sobre a arte marcial do Taekwondo. “Ela mostrou alguns vídeos sobre o esporte e acabei achando bem interessante. Um dos vídeos era do Netinho (Marques), no primeiro campeonato dele nos Jogos Olímpicos da Juventude (2014). Achei muito épico, porque ele estava perdendo, mas mesmo assim não desistiu.”
A palestrante em questão era a lutadora Carmen Carolina, de 45 anos, faixa-preta (3º Dã), conhecida por ser a primeira atleta olímpica de Taekwondo do ano de 2000, em Sydney, na Austrália. Naquele dia, segundo relembra Carneiro, a lutadora olímpica disse que daria aulas do esporte toda quarta-feira no colégio. Mas isso ainda não seria suficiente para o atual praticante atleta se interessar pelo esporte.
“Eu acabei não indo, porque não tinha tanto interesse ainda. Mas um amigo meu falou para mim que era muito legal e demonstrou alguns movimentos para mim. A curiosidade aumentou mais. Fui fazer e acabei gostando”, revela.
Desde então, o jovem Matheus treina, arduamente e em alto rendimento, na Academia de Taekwondo Pro Team, localizada no Grupo Ginástico, e já soma 5 anos do esporte. E quem até então parecia ser-lhe somente uma palestrante, dando aulas de quarta-feira no colégio, Carmen Carolina se tornou sua técnica, junto do treinador Nicholas Pigozzi, de 35 anos, faixa-preta (4º Dã), que supervisionam o treinamento do atleta na academia.
A ARTE DOS PÉS E DAS MÃOS EM COMBATE
O Taekwondo é uma arte marcial coreana. Em três palavras, o atual esporte se traduz em: Tae (pé), kwon (mão) e Do (espírito ou caminho). Segundo o portal do governo, Rede do Esporte, o termo empregado significa “a arte de usar os pés e as mãos na luta”. Curto no nome e na frase. Entretanto, uma história milenar que envolve desenvolvimento e aperfeiçoamento ao longo de todos esses anos.
Enquanto luta, as técnicas de combate envolvem uso de socos e chutes. Enquanto esporte olímpico, os golpes aplicados têm regras que envolvem altura limítrofe dos chutes, área legal para os socos, além de uma arena de 10m², pontuação e categorias de peso tanto para masculino, quanto para feminino.
No Brasil, o taekwondo veio com o mestre Song Min Cho, numa academia em São Paulo, nos anos 70. Em 1973, a modalidade ganhou o primeiro Campeonato Brasileiro. Não obstante, foi nesse ano em que foi fundada, na Coreia do Sul, a Federação Mundial de Taekwondo, que organizou também o primeiro Mundial do esporte.
Nas Olimpíadas de Seul (1988), a capital sul-coreana, e de Barcelona (1992), na Espanha, o taekwondo participou apenas como um esporte de exibição. Nos Jogos de Atlanta (1996), nos EUA, ficou ausente. E só voltaria em 2000, com sede na cidade australiana de Sydney, edição essa em que participou a treinadora do jovem atleta.
QUANDO AS PORTAS SE ABRIRAM
Já dizia o velho ditado, “a pressa é inimiga da perfeição”. E com Matheus não é diferente. O atleta conta um pouco da sua rotina. “Eu acordo de manhã, às 8h30. Bem animado, sabe? Cantando e ouvindo música. Quando chega as 14 horas, à tarde, me preparo para ir para o treino. Eu treino durante 1 hora e meia. Depois, mais à frente, tem outro treino de mesma duração.”
Este treino rotineiro de alta performance é o que garante a Matheus seu rendimento, além de uma motivação para brilhar no esporte. “Quando eu comecei a treinar com alto rendimento, percebi que estava melhorando muito. E muita gente falava que eu teria um futuro brilhante no Taekwondo. Isso foi vêm me motivando cada vez mais”, conta o jovem atleta. Essa expectativa não veio da noite para o dia. Segundo o esportista, um campeonato foi marcante para a decisão de melhorar na prática do taekwondo.
Em novembro de 2018, Matheus Carneiro iniciava sua primeira viagem com a equipe para o Campeonato Bad Boy Open de Taekwondo. O evento foi organizado na cidade de Campinas e recebia, segundo o encarte divulgado na Internet, apoio da prefeitura do município, além da Liga e da Federação Paulista da modalidade. “Lembro que era um desafio contra um chileno, que já vinha ganhando há bastante tempo. Os 2 rounds foram bem difíceis. Tanto que empatamos. Mas veio o último e acabei ganhando”, conta.
O atleta afirma que, na época, ainda era faixa-verde – uma graduação básica no esporte -, mas que sua equipe, Carmen e Nicholas, acreditavam que ele tinha potencial para lutar contra um faixa-preta. “Eu fiquei muito feliz, além da Carmen, minha técnica, e Nicholas, o meu treinador”.
A VIAGEM ATÉ A SÉRVIA
Há quem acredite que a vida é feita de acasos. Outros, que se colhe o que se planta. Para Matheus, talvez uma mistura dos dois. Há 5 anos, o atleta assistia um vídeo do medalhista de ouro Netinho Marques lutando seu primeiro campeonato nos Jogos da Juventude, em 2014, na China. Hoje, em plenos 2021, o jovem teve a chance de acompanhar de perto o treinamento do lutador olímpico, auxiliando-o nos treinos da Paraíba até a Sérvia.
“Fiquei muito feliz, porque eu fiquei pensando sobre aquela vez lá do colégio: ‘Pô, a Carmen me mostrou o vídeo do Netinho nos Jogos Olímpicos da Juventude, onde ele estava tentando buscar um Ouro’. Agora eu fui ajudante dele lá na Sérvia. Logo mais, ele em Tóquio, nas Olimpíadas”, em entrevista, à época.
Questionado sobre como foi fazer todo este trajeto, o atleta disse que sentiu algo diferente. A começar pelos 40 dias que passou pela Paraíba, assistindo e auxiliando nos treinos. E depois na Sérvia. Em tom humorístico, contou ter se “assustado” com os lutadores “gigantes”, nas palavras dele. Mas disse estar bem feliz por ser considerado alguém à altura do medalhista para auxiliar nos treinos.
Adiante, num tom emocionante, o lutador conta que a experiência, tanto aqui no Brasil, pela Paraíba, quanto na Sérvia, tudo servirá de bagagem para a vida. “Foi uma experiência bem grande pra mim. E estou melhorando cada vez mais, acreditando mais em mim. O professor sempre falava ‘Não, você é ‘bão’, você pode ser quem você quiser. A única coisa é que você tem que acreditar em você.”
Não à toa, para Matheus, o Taekwondo representa muito mais que o uso de pés e mãos num combate. Mas representa “família”.
Por Samuel Chagas / Foto: Divulgação