Um incêndio de grandes proporções tomou o Museu Nacional do Rio de Janeiro na noite desse domingo (2).
As chamas só foram controladas às 3 horas desta segunda. O Museu reunia um acervo de mais de 20 milhões de itens, desde coleções de geologia, palentologia, botânica, zoologia e arqueologia. No local, estava a maior coleção de múmias egípcias das Américas.
O Ministério Público Federal (MPF) informou que a perda do acervo é “irreparável”, não podendo ser recuperada por nenhum esforço de reconstrução. O ocorrido esteve entre os temas mais debatidos nas redes sociais, afinal, outros dois incêndios a museus foram registrados nos últimos anos, lembrando do incêndio no Museu da Língua Portuguesa (MLP), na capital paulista, e no Museu Amador Bueno da Veiga, em Rio Claro.
O conservador e restaurador Toninho Sarasá disse ao Diário do Rio Claro que a situação no Museu do RJ é ainda pior, pois no caso do Museu da Cidade Azul, o acervo não estava dentro do prédio e, no caso do MLP, o acervo era virtual. “Foi uma grande perda, porque lá o acervo eram documentos históricos da nossa civilização e isso se perdeu. Perdemos também não só o corpo, mas a alma. O que nos resta é espírito para brigar pelos outros museus, porque esse já se foi”, lamenta o restaurador que trabalhou na recuperação do Museu em Rio Claro.
Para Toninho, a valorização de bens como este passam, primeiramente, pelo público. “Se tem algum culpado em tudo isso, eu acho que o culpado somos nós, a própria sociedade, que é um pouco analfabeta cultural e não sabe cobrar, não sabe olhar. Então, ficamos de mãos atadas, dependendo dessas ações políticas. Deveríamos assumir um pouco mais esse caráter de preservação do patrimônio”.
PATRIMÔNIO
Para a arquiteta e urbanista especializada em patrimônio edificado, Mônica Frandi Ferreira, as instituições museológicas que guardam seu acervo em edificações de interesse histórico e cultural devem adaptar os prédios antigos às demandas atuais de uso e ocupação das edificações, modernizando instalações prediais (principalmente a elétrica) e oferecendo condições de acessibilidade. “Para intervir em edificações históricas, construídas com materiais e técnicas construtivas distintas das atuais, devem ser respeitados critérios legais (quando o prédio é tomado ou nele incide alguma normativa de preservação) e técnicos (levando em conta no projeto arquitetônico as teorias do restauro e as cartas patrimoniais), que garantem que o uso contemporâneo seja pleno.
Essas intervenções, geralmente são custosas e necessitam de recursos e de mão de obra especializada, que ficam comprometidos numa situação de crise financeira”, comenta.
Para a professora de arquitetura da Asser, Carolina Cantiero Talarico dos Santos, o que é preciso mudar é a forma como o patrimônio histórico tombado é tratado aqui no Brasil. “É preciso focar na conservação e manutenção preventiva dessas edificações a fim de evitar tragédias como essa. O edifício histórico tombado precisa de manutenção preventiva constante e de profissionais capacitados para tal ação. Conservar o edifício histórico vai muito além do tombamento e precisa envolver, além de verba, um processo ágil e bem estruturado de manutenção. Sem esse processo, teremos cada vez mais edificações históricas com infraestruturas obsoletas.”
INVESTIMENTO
Maria Teresa de Arruda Campos, ex-superintendente do Arquivo Público Municipal, diz que o momento é muito triste. “O nosso país valoriza tão pouco a nossa cultura, nossa história, a memória. As políticas públicas não valorizam, não cuidam, não fazem a coisa acontecer. Eu me lembrei muito daquele momento de ver o nosso Museu pegando fogo e o empenho do governo de cuidar do museu aqui, de reconstruí-lo.
Agora, no caso do Rio de Janeiro, eu acho que é culpa do governo, porque são questões que os governos têm que tomar conta, têm a responsabilidade de assumir e de cuidar, infelizmente, isso acontece quando a gente ouve falar em cortes de verba, é sempre por aí que as coisas começam”.
MEMÓRIA
A mestranda Samanta do Prado, especialista em memória científica e institucional, destaca que para a memória científica, a perda é imensa. “Se compararmos a Europa, muito se deixa a desejar por conta de investimentos. Algumas entidades ainda não possuem um sistema mais modernizado, isso no sentido de ferramentas, equipamentos de segurança que todo o local tem que ter para ser protegido, informatizado. O investimento na proteção e promoção do patrimônio cultural ainda são fracos”, aponta.
Por Vivian Guilherme