O rio-clarense Elias Fausto foi o primeiro brasileiro a estudar nos EUA. Engenheiro, projetou, construiu e inaugurou o Guarujá, a primeira cidade planejada do Brasil. Alberto Quatrini Bianchi, também de Rio Claro, projetou o Guarujá no turismo internacional.
Tudo aconteceu pelo fascínio que a ilha paradisíaca exerceu sobre Elias Fausto assim que ele a conheceu. A Cia. Prado Chaves era exportadora em Santos e investiu no que viria a ser o Guarujá.
Biografia
Elias Fausto era filho de um dos pioneiros de Rio Claro, o fazendeiro José Elias Pacheco Jordão. Seu pai foi proprietário das fazendas Beri e Covetinga, vereador, presidente da Câmara Municipal na década de 1850 e governador de São Paulo em 1868.
Nascido e educado em Rio Claro, Elias formou-se em engenharia civil nos EUA, tornando-se o primeiro brasileiro a estudar naquele país. Ao retornar para o Brasil, seguiu pela rota familiar de construção e administração de ferrovias, entre elas as companhias Ituana e Paulista.
O projeto
À frente da Cia. Prado Chaves, um dos grupos econômicos mais fortes do Brasil, ele acabou assumindo o projeto sui generis de construir uma cidade. E assim o fez, dando origem ao Guarujá.
A ilha era praticamente deserta, um mero povoado com tradição de haver sido ponto de contrabando de escravos. Mas tinha tudo para ganhar produção adequada e tornar-se a milionária “Pérola do Atlântico”. Assim acabou acontecendo.
Em 1892, Elias Fausto criou uma companhia específica para projetar e construir a cidade balneária que em 2 de setembro do ano seguinte era inaugurada pela elite política e econômica de São Paulo.
O complexo urbano abrangia um hotel de luxo com 50 quartos; um cassino; balneário; 46 casas, uma pequena hidrelétrica com respectiva distribuição; estação e linha de bonde para a ligação ferroviária Santos-SP; igreja; ruas; redes de água e esgoto e duas barcas para ligação com Santos. Num segundo momento, vieram as construções de cinema, zoológico, dois parques de recreação e circuitos por charretes.
Influência americana
O conjunto tinha aspecto de uma cidade do faroeste. A base da construção era a madeira de pinho da Geórgia. Tudo havia sido importado dos EUA já em forma de peças para montagem. As casas eram separadas por cercas, completando o estilo americano. Os investimentos dos milionários no local consolidaram imediatamente a formação da cidade. Nascia o Guarujá.
Em 1897, o hotel, eixo do complexo, pegou fogo. Não sobrou nada. Era tudo de madeira. A Cia. Prado e Chaves deixou o Guarujá e passou a investir na industrialização da capital de SP a partir da fábrica de vidro Santa Marina.
Ferrovias
Elias Fausto vendeu suas fazendas em Itu e Rio Claro e concorreu no projeto industrial da família. Ao mesmo tempo, resgatou a veia política do pai e foi eleito deputado estadual e federal. Assumiu a presidência do Partido Republicano, cuja intensa movimentação acabou promovendo a mudança de regime com o fim do Império através de campanha iniciada em Itu, SP, Campinas, Piracicaba, Rio Claro e Limeira.
Por seu trabalho de expansão da ferrovia no País, o engenheiro rio-clarense passou a ter o seu nome dado ao novo município que se formava a partir de Monte Mor, na região de Campinas. Elias Fausto tornou-se nome da cidade a partir de 1899. Dois anos depois, após contrair pneumonia no inverno português, ele morreu em Paris.
Quanto ao hotel que deu origem ao Guarujá, depois do incêndio, o megainvestidor internacional Percival Farquhar adquiriu a propriedade. Ele contratou Ramos de Azevedo para novo projeto de hotel, cassino e balneário.
Quatrini Bianchi
E assim surgiu o lendário “Hotel de La Plage”, que no início da década de 1930 passou à administração de outro rio-clarense, o milionário Alberto Quatrini Bianchi.
Com Bianchi, o turismo balneário transformou de fato o Guarujá na sofisticada “Pérola do Atlântico”. O luxo e a riqueza do cassino atraíam para o Brasil a nobreza europeia e magnatas dos EUA. A antiga elite cafeeira e os novos ricos do período Vargas fizeram das roletas do “La Plage”, o ponto de encontro onde tudo se podia. E acontecia. Até 1947, quando Vargas deixou o poder e o jogo foi proibido no País.
Perfil
Filho de Domingos Bianchi e Catarina Quatrini, ambos italianos, nasceu no distrito de Santa Gertrudes, em Rio Claro, no dia 28 de maio de 1892. Cursou o primário em escola pública de Rio Claro. Autodidata, falava quatro línguas. De sua família, há a informação de ter sido casado com Antonieta e ter o irmão Severino, um de seus principais gerentes.
Entre outros rio-clarenses de seu círculo de amizade estiveram os irmãos Fina, em especial o advogado revolucionário João Fina Sobrinho, a cantora Dalva de Oliveira e Adelino Rodrigues Jordão, cunhado de José Eduardo Leite. Bianchi foi proprietário ou arrendatário dos cassinos, termas balneárias ou hotéis: Pale Hotel de Ouro Preto (MG), Palace Casino de Poços de Caldas (MG), Hotel de La Plage e Cassino de Guarujá (SP), Hotel Palace de São Luis (MA), Hotel Palace do Recife (PE) Hotel e Cassino Palace de Salvador (BA), Icaraí Hotel (RJ), Serra Negra Hotel (SP), além de dezenas de cassinos no Rio de Janeiro e demais estados. Seu último grande empreendimento foi o Grande Hotel Guarapari (ES).
No Guarujá
Quatrini Bianchi projetou a fama internacional do Guarujá com o Grand Hotel de La Plage, local de frequência da mais fina flor de São Paulo. O ponto era o preferido de Matarazzo, Carmem Mayrink Veiga (considerada uma das mulheres mais elegantes do mundo, ela nasceu em Torrinha-SP), Assis Chateaubriand, Baby Pignatari, os Prados, além de reis e rainhas da Europa.
O La Plage trazia linhas europeias e era decorado com tapetes persas. Ao seu lado, esteve o Cassino do Guarujá, explorado por Bianchi. No hotel, Santos Dummont passou seus últimos dias. Até, em 1932, enforcar-se com uma gravata em um dos quartos, por depressão. Ele estaria abalado por saber que aviões estavam sendo usados na Revolução de 1932. “Eu inventei a desgraça do mundo”, penalizava-se.
Datas do Guarujá
Historiadores do Guarujá concordam que o município tem significativa lacuna em sua memória por não oficializar o nome de Elias Fausto Pacheco Jordão como fundador da estância balneária.
A cidade não comemora o aniversário de sua fundação, que aconteceu em 2 de setembro de 1893, por iniciativa do engenheiro rio-clarense.
O Guarujá tem como data oficial apenas o dia 30 de junho, que marca sua emancipação da cidade de Santos em 1934. O dia do padroeiro Santo Amaro, 15 de janeiro, é eventualmente marcado por ponto facultativo a depender de decisão de cada prefeito.
Se aquele calendário oficial é mantido em descompasso com os fatos, a memória nacional é rica ao registrar um dos mais incríveis empreendimentos do turismo brasileiro, que foi a fundação do Guarujá. A imprensa especializada, livros e conteúdos na net ampliam seguidamente as informações sobre este feito tão admirado.
Fotos: Divulgação / Por J.R.Sant´Ana