O geólogo Fábio Augusto Gomes Vieira Reis, professor do departamento de geologia aplicada do IGCE – Unesp Rio Claro, defendeu mais investimentos em pesquisa, desenvolvimento e inovação no setor de mineração do Brasil.
O tema veio à tona com o rompimento da barragem de Brumadinho, em Minas Gerais, que até o último balanço matou 115 pessoas e outras 248 continuam desaparecidas. “Falta investimento em pesquisa, desenvolvimento e inovação para criar um produto econômico com o rejeito”, enfatizou.
O rejeito, conforme explicou o professor, é o material que sobra do beneficiamento (extração) do minério da rocha. “Quando é feito o beneficiamento, sobra o rejeito, que tem que ser depositado em algum local. Uma das técnicas utilizadas é a montante”, esclarece.
De acordo com Reis, o Brasil é um médio exportador de matéria-prima, cenário que deveria ser repensado. “Não existe uma política clara que obrigue as empresas a investirem em pesquisa, como é feito nas indústria de gás e petróleo, por exemplo”, diz.
As pesquisas, conforme declarou, além de apontarem um possível uso econômico do rejeito da mineração, poderiam gerar técnicas novas de segurança e de armazenamento. “O desenvolvimento está muito ligado às empresas e tem que aumentar muito”, defende.
BRASIL
No Brasil, o investimento na área de pesquisa é de 1,22% do Produto Interno Bruto (PIB). “Desse montante, 55% é financiamento do governo e o restante, basicamente, é a Petrobrás que investe, ou seja, uma empresa pública”, explica.
Ele cita como exemplos a Coreia, Suíça e Cingapura, que investem de 3% a 5% no setor. “Cingapura é minúscula, mas investe pesado. Se houver esses investimento, teremos uma indústria que não é apenas de matéria-prima”, diz ao destacar a necessidade de dobrar o investimento no país.
POLÍTICA PÚBLICA
O geólogo destacou que devido à falta de investimento do setor privado em pessquisa, desenvolvimento e inovação, o poder público tem que promover políticas públicas para garantir a participação das empresas. “Infelizmente, precisa ter políticas públicas para obrigar que as empresas invistam no setor”, afirma.
CFEM
O professor destacou ainda a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM). Considerada o royalty da mineração, é distribuída aos municípios (65%), estados (23%) e união (12%). “Em 2018, foram mais de R$ 3 bilhões de royaltys só com mineração. É preciso discutir a utililização desses recursos e apoiar a pesquisa”, afirma.
BRUMADINHO
A barragem de rejeitos que rompeu em Brumadinho utiliza o método a montante, conforme explicou o geólogo. “É o modelo mais usado. Esse rejeito é, basicamente, rocha moída e água”, esclarece.
De acordo com o especialista, o modelo é questionado entre os especialistas. “Você vai alteando o barramento sobre o reservatório de rejeito e esse é o problema. Dessa forma não consegue o controle da resistência da base do material”, diz.
Outro ponto observado por Reis é o tempo de operação da barragem. “São 40 anos de operação e diferentes empresas operaram. Nem sempre foi da Vale. O alteamento foi feito em condições diferentes”, avalia.
Outros dois modelos de armazenamento de rejeito foram citados por ele: o linha de centro e o a jusante.
REVISÃO
O método de amontante está dentro da legislação, mas em função das duas tragédias, a primeira em Mariana e a mais recente em Brumadinho, Reis acredita que o método deve ser mudado. “A legislação e os órgãos de fiscalização permitem esse método, mas já passou do tempo de rever. Em Minas, a justiça já proibiu modelos de barragem a montante. “Possivelmente, será proibido no Brasil todo”, frisa.
Brasil conta com apenas 35 técnicos para fiscalizar setor de mineração
A Agência Nacional de Mineração (ANM), responsável pela fiscalização das mineradoras, possui apenas 35 fiscais capacitados para atuar no país. O número, considerado insuficiente pelo geólogo Fábio Augusto Gomes Vieira Reis, coloca em risco a situação do setor. “Tem que ser mais rigoroso. As empresas têm que seguir as normas e o órgão de fiscalização tem que atuar”, analisa.
Reis explica que o órgão passou de departamento para agência, mas não houve nenhum tipo de investimento. “Só mudaram a placa. A ANM está sucateada”, critica.
Outro ponto observado por ele é que os fiscais não atuam somente nas barragens. “Esse não é apenas o único trabalho dos fiscais, existem outras coisas que precisam fiscalizar”, diz
Vale destacar que o governo federal usa só laudos produzidos pelas próprias mineradoras ou por auditorias contratadas. São elas que atestam a segurança das suas estruturas. A autorregulamentação é definida na Lei Federal 12.334, de 2010, e é adotada também em outros países. São previstos dois tipos de inspeção: a regular, feita pela própria empresa, e a especial, realizada por equipe multidisciplinar contratada pela empresa, de acordo com orientações da ANM.
O geólogo fez duras críticas à falta de recursos para a ANM. “Um único deputado tem mais assessores que o órgão de fiscalização tem de fiscais”, finaliza.