Transições de fases são fenômenos presentes no cotidiano. As mais conhecidas são as transições de fase da água entre os estados sólido, líquido e gasoso. Uma transição de fase que tem sido o foco de diversas investigações científicas é a chamada “transição de Mott”. O nome atribuído ao fenômeno homenageia o físico britânico Sir Nevill Francis Mott (1905-1996), prêmio Nobel de Física de 1977. Esta transição ocorre quando um sistema metálico, ou seja, que possui elétrons itinerantes e por isso conduz a corrente elétrica, se torna isolante. Isso acontece devido à variação de parâmetros externos, como, por exemplo, a pressão ou a dopagem.
“Quando o parâmetro de controle atinge um valor crítico, os elétrons se localizam e a fase isolante é então estabelecida. Em suma, uma transição metal-isolante de Mott genuína acontece quando a razão entre duas escalas de energia, a repulsão coulombiana entre os elétrons e a largura da banda eletrônica, atinge um valor crítico”, explica Mariano de Souza, professor do Departamento de Física da Universidade Estadual Paulista (Unesp), no campus de Rio Claro.
Souza foi o coordenador de um estudo, publicado no Journal of Applied Physics, que reporta novos aspectos sobre a transição de Mott. O estudo recebeu apoio da FAPESP por meio do projeto de pesquisa regular “Investigação das propriedades termodinâmicas e de transporte de sistemas eletrônicos fortemente correlacionados”, conduzido por Souza.
“Nosso estudo concentrou-se no entendimento da física na região de coexistência das fases metálica e isolante, próxima ao ponto crítico. Nessa região, ‘poças’ metálicas são incorporadas em uma matriz isolante. Há uma linha de transição que termina no ponto crítico”, relata o pesquisador.
O destaque do estudo é a demonstração da região de coexistência como uma fase eletrônica na qual “poças” metálicas não polarizadas, distribuídas aleatoriamente, estão imersas em uma matriz isolante polarizada. Trata-se de uma analogia à “fase magnética de Griffiths”, proposta pelo físico norte-americano Robert Griffiths em 1969.
“Demonstramos que, ao se aproximar da linha de transição de fase de primeira ordem, o tempo de relaxação do sistema aumenta expressivamente. Isso indica uma redução da dinâmica associada às excitações eletrônicas. Tal fato, junto com a desordem espacial randômica devida à presença das ‘poças’ metálicas na matriz isolante, levou à nossa proposta da região de coexistência de fases metal-isolante de Mott como uma fase eletrônica do tipo Griffiths”, afirma Souza.
Os autores do estudo associaram ainda ao fenômeno o “parâmetro de Grüneisen elétrico”, que quantifica o efeito eletrocalórico, ou seja, a mudança de temperatura em resposta à variação do campo elétrico externo sob condições adiabáticas – isto é, sem trocas de calor com o ambiente. “Tal parâmetro permite inferir que expressivo efeito eletrocalórico ocorre quando o sistema se aproxima da linha de transição de fase de primeira ordem e do ponto crítico”, comenta Souza.
O artigo agora publicado constitui parte da tese de doutorado de Isys Mello e Lucas Squillante, ambos orientandos do professor Mariano de Souza. O pesquisador Antonio Seridonio (Unesp – Campus de Ilha Solteira) e o doutorando Gabriel Gomes (Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo, IAG-USP) também assinam o artigo.
O artigo Griffiths-like phase close to the Mott transition pode ser acessado em https://aip.scitation.org/doi/10.1063/5.0018604.
Por Fapesp / Foto: Arquivo/Divulgação