Está mais do que evidente que nos resta apenas o momento presente. E estamos sofrendo hoje de uma “nostalgia do futuro”. Daquele futuro que planejamos para este ano ainda e que não será mais possível executar. De um futuro prometido no Réveillon de 2019 para 2020. Cadê? Sumiu. Agora é pensar no agora, com exceção de uma meia dúzia de abastados agarrados que estão ao seu dinheiro, como se isso fosse garantia de futuro, estamos à própria sorte. Mas, na real, sempre estivemos. É que antes da Covid-19 dava para disfarçar mais.
Sempre estamos por um triz. Tudo à flor da pele. À mínima provocação, uma fechada no trânsito, uma cobrança indevida que recebemos de alguém próximo, é o que basta nos colocar nervosos, raivosos, muitas vezes com os punhos cerrados e mostrando os dentes. Ainda mais agora, com toda essa incerteza provocada pela pandemia e as notícias que não param de chegar.
É preciso se equilibrar, manter a fé, para quem tem, e esperar. Mas é justamente a espera, filha da impotência diante dos fatos, que nos gera angústia.
Em dias normais, dos quais estamos com saudades, mesmo quem mais se controla fisicamente, vê sua fera interior despertar em pensamentos em várias situações.
A culpa sempre está nos outros, no trabalho, o governo abusivo, a pessoa com quem nos relacionamos, os filhos. Sempre somos reféns dessa ideia de jogar a responsabilidade nos outros.
É que é cada vez mais difícil olhar para dentro, admitir erros, tentar corrigi-los e, principalmente, querer melhorar, evoluir enfim e se reinventar.
Justificamos nossos fracassos a partir de fatores externos. Perceba, é muito raro encontrar alguém que confesse os erros e fracassos, ou sua parcela de culpa para não ter feito o que queria. Pode soar mal, na empresa, em casa diante dos filhos, dos amigos. Basta então fingir-se forte, ter a boa aparência, sufocar o verdadeiro eu. E parece fácil transitar nesse micro-mundo em que todos pensam em atitudes que sejam, digamos, “instagramáveis”.
E se nada dá certo é porque sou vítima, sobretudo se pertenço a algum grupo minoritário. Exercendo esse tipo de comportamento, nasce em mim um comodismo que se mistura ao masoquismo e conformismo, e outros ismos, numa sopa mais fácil de digerir.
Precisamos nos bancar emocionalmente, sem nos pendurarmos nas digital influencers do momento, no corpo dos sonhos que não existe, na casa, no carro, sem pensar que ser feliz está no quando, mas pode ser hoje, em casa, confinado em quarentena sem saber se continuará com seu emprego.