O que eu considero instigante, desafiante em Literatura, e o que, de fato, me faz escrever ficção, são as possibilidades que a Literatura oferece de falar a mesma coisa com outras palavras, de sugerir ao invés de demonstrar, de buscar nas entranhas da psique humana, a causa dos acontecimentos, os mais absurdos e imprevisíveis.
Há sempre um outro modo de descrever o que os olhos não veem mas o coração sente e a mente imagina, dando-lhe a forma da realidade possível daqueles que se lançam à ousadia da criação.
Por isso eu admiro escritores como Kafka, Beckett, Cortázar, na prosa, e Herberto Hélder e Fernando Pessoa, na poesia. Porque eles tentaram ir além da mesmice, da técnica admitida como oficial e indispensável.
Eu confesso que, atualmente, eu não consigo ir além de duas ou três frases, escolhidas à esmo, dos livros escritos pelos autores da atualidade que me caem às mãos, por descuido da providência divina.
Esses livros, são resultado de pura técnica, é roteiro pré-estabelecido na caça ao tesouro, é mesmice. E isso não me atrai. Talvez eu seja exigente demais. Se sou comigo, em se tratando de Literatura, porque não seria com os outros?
Depois de tudo o que já li ou tentei ler, concluo, ainda que levianamente, como convém a todo bom escritor audacioso, que, noventa por cento dos livros de ficção escritos e publicados são mera distração às nossas mentes modestas e mal acostumadas.
Raros são aqueles livros que, de fato, nos fazem pensar, nos arrancam da realidade em que nos encontramos e nos transportam para uma outra realidade, onde tudo é possível.
Talvez, eu seja um chato, nesse aspecto. Mas, talvez, por isso, também, 90% dos livros escritos e publicados, seja de autores brasileiros ou estrangeiros, segundo minhas observações, mofam nas prateleiras das bibliotecas particulares e públicas. O que é lamentável. E, em certos aspectos, odioso, para quem, feito este que vos escreve, atento leitor e generosa leitora, ama os livros.
No mar imenso e, ora agitado e ora calmo demais, dos livros de ficção, raramente se encontra peixe bonito, saudável e robusto. A maioria das páginas encontradas, não passam de dejeto.
Não pretendo com isso desestimular as pessoas quanto à Literatura e a leitura de livros de ficção, aqueles livros que contam histórias que, em teoria, deveriam nos proporcionar uma aventura fascinante. Ao contrário, essa provocação visa justamente, despertar o interesse das pessoas descuidadas e desatentas quanto à presença indispensável dos livros de ficção em nossas vidas.
Que cada um faça sua viagem intelectual por esse mundo imprevisível dos livros de ficção, porque, certamente, encontrará àquilo que satisfaça suas pretensões menos ambiciosas. Eu, de minha parte, não abro mão do prazer que essa viagem me proporciona, apesar dos percalços e das decepções do percurso. Sempre vale a pena ter um livro de ficção na bagagem, ao alcance da mão. Ainda mais, vivendo neste mundo, cada vez mais superficial, mais cínico e desonesto.
Foi nesse instante em que o telefone da sala tocou e interrompeu a torrente de ideias que alimentavam a mente sempre agitada do professor Nikolas. Repousou a caneta sobre a mesa, olhou na direção da cozinha e percebeu que Eufrosina, a diarista, não estava por perto. Era sua grande chance de burlar as recomendações médicas e saborear o delicioso café de cada manhã. A carta que escrevia ao seu aluno interessado em aprender sobre livros e escritores, ficaria pra depois. Ao chegar à cozinha, deparou-se nada surpreso com a presença de seu gato misterioso deitado confortavelmente sobre a pia, ao lado da garrafa térmica, tomando uma fresca e a olhá-lo com cara de sono.
Por Geraldo Costa Jr. / Foto: Imagem ilustrativa/Reprodução/Internet