O governador João Doria instituiu no calendário oficial do Estado o “Dia de oração pelas autoridades da nação”. A lei 17.136 foi publicada no Diário Oficial na quarta-feira (31) e será celebrada toda terceira segunda-feira de cada mês.
A iniciativa partiu de projeto de lei aprovado na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) e de autoria dos deputados Chico Sardeli (PV) e Reinaldo Alguz (PV).
Na justificativa para que a matéria fosse aprovada na Casa de Leis, os parlamentares destacam: “É comum ouvirmos críticas e condenações verbais a respeito de nossos governantes e políticos em geral. A Bíblia sagrada fala que toda autoridade é levantada por Deus, mesmo aquelas que nos fazem perecer”.
E prossegue: “Portanto, requeiro aos nobres pares que nos apoiem na aprovação dessa propositura, para que se torne um hábito. Que o povo passe a orar e não a criticar as autoridades constituídas no Estado de São Paulo e por toda Nação Brasileira”.
A matéria não indica, tampouco sugere quais ações serão realizadas para a comemoração, deixando vago se haverá ou não investimentos governamentais na data.
ANÁLISE
O presidente da OAB Rio Claro, Mozart Gramiscelli Ferreira, avalia que se trata de falta de foco. “Acredito que, apesar das autoridades merecerem as orações de todos, pois têm a dura missão de zelar pelo patrimônio público, este tipo de legislação nasce, me parece, da extrema falta de foco no que é realmente importante e no que a população espera de seus representantes do legislativo. Oportunamente, verificaremos os nobres deputados dizendo que aprovaram dezenas de leis que na sua maioria não demandam uma discussão popular. Nada republicano”, enfatiza.
REFLEXÃO
Já o secretário de Segurança, Defesa Civil, Mobilidade Urbana e Sistema Viário, Marco Antonio Bellagamba, acredita que a ação do governador provoca uma reflexão. “Doria provoca uma reflexão e resgate da fé, emanando para as pessoas que se encontram nessa posição bons fluídos e força para enfrentar obstáculos”, opina.
LAICO
A Constituição Federal mantém em seu escopo dispositivos que classificam o país como laico. Em seu artigo 5º, parágrafo VI, o texto assegura como inviolável a liberdade de consciência e de crença. Já no artigo 19, o texto reforça que é vedado à União, estados e municípios, estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança.
Questionado se incluir a data no calendário oficial do Estado seria uma forma de ferir esse caráter laico, o juiz e diretor do Fórum de Rio Claro, Cláudio Pavão, opina que não. “O Estado é laico, não ateu ou agnóstico. Não fere nada, na minha opinião”, diz.
Sobre a importância da lei, provocou: “Se quem foi eleito para legislar achou importante, quem sou eu para discordar?”.
DEFESA
Vagner Llari, da Ação Nacional Patriótica Brasileira (ANPB), vê como válido incluir a data no calendário oficial. “Como cristão, apoio a lei aprovada pela Assembleia Legislativa e sancionada por Doria. Nós, católicos, sempre oramos pelas autoridades e governantes de nosso país, seja nas missas [etc.]”, acredita.
Na defensiva, depois da declaração, prevê: “Vão ter os que irão criticar, mas esses são os que não têm fé nenhuma em nada. O que já se explica a crítica”.
DESNECESSÁRIO
O ex-prefeito Nevoeiro Junior (Democratas) destacou que é dever de todo cristão orar sempre pelas autoridades. Mas acredita que não seria necessário instituir um dia oficial para isso. “É algo proposto por alguém que não conhece direito o que é ser cristão”, pondera.
ESCRITURA
O pastor da Igreja Nazareno Central de Rio Claro, Luís Henrique Biazon, frisou que o texto bíblico é claro ao afirmar a necessidade de orar pelas autoridades, mas ponderou que impor algo ao cidadão pode ter efeito reverso. “Qualquer coisa imposta não é legal, especialmente no sentido da religião”, esclarece.
“Mas sabemos que o povo cristão é um pouco relaxado. Olhando pelo lado de lembrar o povo para a oração, acredito ser positivo, mas todo mundo tem o direito de exercer sua cidadania, cobrar e protestar. O fato de intercedermos pelas autoridades não quer dizer que concordemos com todas as ações”, acrescenta.
SOCIEDADE JUSTA
O Padre Renato Luís Andreato, da Paróquia Nossa Senhora Aparecida, vê necessidade na oração para os políticos. “A necessidade é muito grande para que nossos políticos possam assumir seus postos em prol do povo. Eles necessitam de oração para que tenham uma vida digna, a serviço do povo e em prol de uma sociedade mais justa, igualitária e, acima de tudo, honesta”, comenta sobre o tema.