Poucas canções são capazes de expressar com tanta clareza a dor de uma saudade quanto “Naquela Mesa”, escrita em 1972 pelo jornalista e compositor Sérgio Bittencourt. A música foi criada para seu pai, Jacob do Bandolim, e eternizada na voz de grandes músicos, como Nelson Gonçalves. “Todo mundo tem em casa aquela mesa num canto, onde viu seu pai sentado um dia, é algo tão simples que chega a rasgar o peito de saudade”, diz o músico Wellington Ronqui, da Orquestra Filarmônica de Rio Claro.
Apesar da saudade não escolher data para se manifestar, algumas em especial, costumam ser mais dolorosas, como o Dia dos Pais. “Ninguém pensa na morte, mas, ela chega para todo mundo. Em julho do ano passado meu pai descobriu um câncer no pulmão, não estávamos preparados, foi tudo muito rápido. Esse será nosso primeiro Dia dos Pais sem ele, ainda dói demais, quanta falta ele faz”, lembra Débora Bernardi, filha caçula de três irmãos.
Nem mesmo quem já tem mais tempo de ausência é capaz de conter a emoção nessa data. Ana Meire Serra Reina perdeu o pai em 2019 vítima de uma embolia pulmonar. “No dia a dia acabamos nos envolvendo com as tarefas e fica mais fácil. Mas, esquecer nunca. Sempre foi um homem íntegro e muito honesto com um sorrisão no rosto. Conhecia todo mundo, era sempre gentil e educado, um amigão para todos os momentos de alegrias e tristezas”, diz.
Se de um lado pais e filhos se separam por questões naturais da vida, outros, fazem por opção ou necessidade. É o caso de Lucas Félix Bardi, que sofre a ausência do pai que se afastou da família após o divórcio. “Ele se casou de novo e foi morar em Curitiba, ficamos mais de dois meses sem nos falarmos. Senti muita falta do meu pai, principalmente em 2011 quando nasceu nossa pequena e prematura Maria Clara, ficamos sem chão, estava sozinho, precisava muito dele”, lamenta.
Pai de uma menina de 10 anos e um menino de 5 meses, Lucas tenta fazer o caminho inverso. “Quero muito que meus filhos saibam o quanto são amados. Não quero que sintam a ausência do pai como eu sinto.”
Segundo um estudo realizado por cientistas da Universidade de Bar Ilan, em Israel, o cérebro tem um mecanismo de defesa que nos protege do medo existencial da morte. “Com isso, as vezes negligenciamos algumas coisas importantes que deveriam acontecer mesmo que a morte não fosse certa, como, expor os sentimentos, dizer o quanto o outro é amado, principalmente nas relações afetivas entre pais e filhos”, explica a psicóloga Carla Drago.
Para os que ainda podem comemorar o Dia dos Pais neste domingo, essa é uma boa oportunidade de começar a colocar essa lição em prática. “Apesar do distanciamento social, existem várias formas de se expressar amor, gratidão e até saudade, a tecnologia está aí para nos auxiliar”, diz Carla.
Para os que já não tem mais essa chance, fica a saudade e as incontáveis histórias, registradas em fotos, pedaços de papel, vídeos, mas, principalmente na memória. “Eu queria tanto poder dizer para ele como eu me sinto. Tantas coisas que eu não disse, tantos abraços que eu não dei, tantos beijos. Ele foi muito amado por nós, mas, quando a saudade aperta, parece que tudo o que fizemos, ainda não foi suficiente”, diz Débora.
Wellington também não teve a chance de se despedir, ele cursava faculdade de música em Campinas quando recebeu a notícia de que o pai havia sofrido um infarto fulminante. “Não tivemos a última conversa, o último olhar, o que ficou realmente foi a lembrança de um pai, de um amigo, de uma pessoa que sempre ficará em minha vida, em minha essência”, desabafa.
“Fica também o alerta para os pais, para que se aproximem dos seus filhos, falem do cotidiano, sobre a vida, dores, alegrias. O pai não precisa ser um herói para ser amado, basta ser pai na concepção da própria palavra”, diz Carla.
E nos seus olhos eram tanto brilho, que mais que seu filho, eu virei seu fã, já dizia a letra e o coração de Sérgio Bittencourt.
Por Colaboração Patrícia Alves / Foto: Divulgação