O café é uma bebida estimulante, que só de ouvir a palavra faz o cérebro lembrar de todo o aroma, sabor e memória afetiva envolvida com seu consumo. Embora considerada a segunda mais consumida no mundo, apenas nas últimas três décadas (1990-2018), a produção e o consumo de café aumentaram em até 160% [dados da International Coffee Organization – Organização Internacional do Café]. O Brasil, por sinal, é o maior produtor e exportador, com mais de 35 milhões de sacas colhidas em 2018 [dados da ABIC – Associação Brasileira da Indústria de Café].
Mas os efeitos do consumo de café também tem atiçado a curiosidade da ciência. Neste contexto, pesquisadores do Laboratório de Carcinogênese Química e Experimental (LCQE), do Instituto de Biociências da Unesp de Botucatu, têm conduzido nos últimos anos estudos em torno desta “unanimidade gastronômica”. Mais especificamente, em como os componentes desta bebida tão popular podem auxiliar na saúde das pessoas.
Desde 2012, o Prof. Luís Fernando Barbisan e sua equipe têm se dedicado a pesquisas que relacionam os efeitos do consumo de café ou cafeína na redução de fibrose hepática e de desenvolvimento de lesões hepáticas (pré-cancerígenas e cancerígenas). Doenças deste tipo chegam a atingir cerca de 4,3 milhões pessoas todo ano e causam, aproximadamente, 3 milhões de mortes, segundo dados da OMS (Organização Mundial da Saúde).
Os estudos realizados em Botucatu, em colaboração com o Hospital de Amor (Hospital do Câncer de Barretos) e Universidade de Cagliari na Itália, demonstram que a associação de substâncias específicas do café (cafeína, trigonelina e ácido clorogênico) pode reduzir o desenvolvimento de fibrose e carcinogênese hepática (câncer no fígado) pela modulação de microRNAs. Os testes foram feitos em camundongos. No modelos animal, o café reduziu em 43% a quantidade de lesões precursoras no fígado.
Segundo Barbisan, diferente do que muitos possam acreditar, apesar de abundante, não é apenas a cafeína a grande responsável pelos efeitos benéficos do consumo do café sobre o trato intestinal e fígado. Mas, sim, uma combinação das substâncias presentes na bebida.
Como sugerido pela publicação do artigo de revisão “Drinking for protection? Epidemiological and experimental evidence on the beneficial effects of coffee or major coffee compounds against gastrointestinal and liver carcinogenesis” publicado este ano na revista Food Research International.
“Nossos resultados experimentais indicam que a combinação dos três compostos mais abundantes do café (cafeína + trigonelina + ácido clorogênico) demonstrou melhores resultados do que a cafeína isoladamente. Essa redução pode estar relacionada ao aumento na expressão dos microRNAs(miR) 144-3p e miR-15-5p no fígado dos animais, que podem atenuar a proliferação e induzir a apoptose (morte celular programada), reduzindo o desenvolvimento de lesões pré-cancerígenas nos camundongos”, argumenta Barbisan.
“Os miRNAs são pequenas moléculas que controlam a expressão gênica nas células, podendo regular proliferação, morte celular, inflamação, metabolismo, e outros processos celulares importantes tanto para células normais quanto cancerígenas. O efeito de substâncias do café sobre essas moléculas é pouco investigado, e essa é a principal novidade dos nossos projetos”, complementa o docente.
Aos animais do experimento era administrado doses diárias de cafeína, trigonelina e ácido clorogênico, isoladamente ou em combinações, equivalentes às concentrações encontradas em duas a três xícaras de café para o ser humano [consumo médio de café/cafeína nos EUA e na Europa].
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) e Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar – European Food Safety Authority (EFSA), em inglês – o consumo dessa substância deve limitar-se a no máximo 400 mg cafeína/dia, correspondendo de três a quatro xícaras de café filtrado “comum” ou expresso.
Por Assessoria Unesp