O segundo mês do ano é dedicado à conscientização de três doenças que afetam milhões de pessoas ao redor do globo: Alzheimer, fibromialgia e lúpus.
Há uma semana, o Diário do Rio Claro trouxe reportagem em que esmiuçou a respeito do Alzheimer. Dando sequência às enfermidades as quais o Fevereiro Roxo visa conscientizar, o Centenário abordará hoje a fibromialgia. Para tanto, conversou com Nair Helena Cerri Hebling, médica fisiatra e acupunturista, que atendeu à reportagem e se prontificou a falar a respeito.
O que é a fibromialgia?
Segundo a especialista, trata-se de uma síndrome dolorosa, difusa, que acomete o corpo todo, além de crônica, mas que tem evolução em crises. “Isto significa que as dores podem ter variação importante de intensidade, ora mais leves, ora em crises de forte agudização, chegando a dificultar a vida cotidiana do paciente.”
Quais são as causas?
Conforme explica, ainda são pouco comprovadas. Existem há muitos anos, de acordo com Nair, várias linhas de investigação em pesquisa, sem muito se conseguir comprovar. “De forma mais frequente, verifica-se que o quadro pode ser desencadeado por sintomas emocionais, como ansiedade, depressão ou traumas vivenciados pelos pacientes e que, depois de algum tempo, começam a ter os sintomas”, elucida.
Ela enfatiza que é preciso ficar claro que a fibromialgia não ocorre obrigatoriamente em pacientes ansiosos ou depressivos. “Não há uma correlação matemática entre essas patologias. Apenas estatisticamente os quadros de fibromialgia parecem ser conectados aos sintomas dessas doenças.”
Os sintomas
A médica fisiatra e acupunturista afirma que os principais são sensação de fadiga muscular, dores difusas pelo corpo (como aquelas que ocorrem no início de um quadro gripal) de intensidade variável, que podem ocorrer mesmo no repouso. Nair diz que o paciente sente uma grande fraqueza, chega a ter que interromper suas atividades algumas vezes para conseguir concluí-las e, quando as conclui, fica com sensação de cansaço intenso, desproporcional ao esforço realizado.
“Desta forma, o indivíduo fica menos produtivo, acaba tendo alto índice de faltas ou afastamentos do trabalho e, além de tudo, como nenhum exame é capaz de comprovar a doença, passa a ser estigmatizado em seu meio como uma pessoa indolente ou ‘sem vontade’, o que só piora seu estado emocional e suas dores”, explana e acrescenta que, de forma geral, qualquer um pode desenvolver a doença.
O diagnóstico
Nair garante que é feito por exclusão. Ou seja, na vigência de um quadro doloroso intenso e inespecífico, é fundamental uma pesquisa clínica extensa, com exames laboratoriais, de imagem, de condução nervosa. “São inúmeras as circunstâncias que podem ter períodos de dores generalizadas como parte de seus sintomas.
De problemas reumatológicos a doenças autoimunes, de alterações hormonais a neurológicas. O caminho dos pacientes até o diagnóstico é longo e penoso. Mais uma vez, motivo de desânimo e depressão para o doente.
Finalmente, se nada é confirmado nos exames, tem-se o diagnóstico final”, esclarece.
Tratamento
A especialista expõe que a fibromialgia é uma síndrome ainda sem cura. Por tratar-se de uma alteração na percepção que o paciente tem de dor, não existe uma medida que altere, de forma mais imediata, esta percepção. “Existem, sim, muitas medidas de controle dos sintomas e, posteriormente, medidas de manutenção de resultados.
Em relação às medidas de analgesia, existe uma gama numerosa de combinações de medicamentos, entre analgésicos de diferentes potências, antidepressivos e medicamentos para controle da sensação de dor ao nível do sistema nervoso central. Também se usam, para controle das dores, a acupuntura, a massoterapia e, em casos até mais graves, implantes de bombas injetoras de medicamentos para controle das dores ao nível das raízes nervosas da medula.”
Segundo Nair, outras medidas são psicoterapia, terapia ocupacional, meditação e atividade física regular e leve. Ela exemplifica que, na maior parte, estas medidas aumentam a produção de endorfinas, substâncias que provocam uma sensação de bem-estar e aliviam os sintomas. “Muito importante é ressocializar o indivíduo com fibromialgia.
Os pacientes tendem a se isolar e reduzir suas atividades junto a outras pessoas. Isso faz com que tenham ‘mais tempo para sentir dor’, e acabam valorizando muito os sintomas e, em pouco tempo, as dores ocupam o centro de suas atenções e, portanto, só pioram. Uma vida social, com atividades coletivas, permite que o paciente viva outras experiências além de suas dores e se fortalece para enfrentar o quadro”, aclara.
Fevereiro Roxo
Nair garante ser muito importante falar sobre o tema, em especial para deixar claro que o paciente com fibromialgia não é, necessariamente, indolente, preguiçoso ou “folgado”. É, de acordo com ela, uma pessoa com sensibilidade dolorosa diferenciada e que necessita do tratamento próprio para conseguir cumprir suas tarefas, da mesma forma que alguém com diabetes grave, hipertensão, crises convulsivas, cada um com suas necessidades de tratamento.
Síndrome dolorosa miofascial
“Nem todo mundo que tem muitas dores pelo corpo tem fibromialgia. Nem toda dor vem de quadro depressivo. Uma das coisas mais frequentes é diagnóstico de fibromialgia em indivíduos com osteoartrose, alteração postural, compressões nervosas etc. Todas estas circunstâncias, se não forem corretamente tratadas, permitem que as dores se ‘alastrem’ pelo corpo e isto tem outro nome: síndrome dolorosa miofascial.”
Ao Centenário, Nair esclarece que a síndrome dolorosa miofascial tem cura. Medidas que tratem o problema de origem são capazes de melhorar significativamente o quadro. Um diagnóstico de fibromialgia pode impedir o tratamento correto de ser realizado. Para os pacientes com diagnóstico confirmado de fibromialgia, as palavras são persistência e atenção.
“Persistência, para realizar o tratamento e todas as suas opções. Atenção, para valorizar os momentos de melhora, os amigos que serão feitos ao longo do tratamento e todo o aprendizado que a experiência proporciona ao paciente, sobre si mesmo e sobre o mudo”, finaliza.
Aspectos psicológicos
A professora doutora Lúcia Helena Hebling Almeida, psicóloga clínica com consultório em Rio Claro e professora convidada na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) tem participado desta série de matérias alusiva às enfermidades que estão sendo destacadas neste Fevereiro Roxo.
Para ela, há um forte componente psicossomático na fibromialgia. “Do ponto de vista psíquico, são pessoas sensíveis e muito vulneráveis ao meio exterior, algumas com um embotamento afetivo e dificuldades de expressar seus sentimentos. Ocorre um ‘esgotamento psicológico por stress’; há uma tendência ao ‘catastrofismo’, à ‘vitimização’, às vezes uma hiperatividade prévia – a pessoa não para e tem dificuldade de concentração; um contexto de tensão emocional constante, o que acaba desencadeando ansiedade e sintomas depressivos”, explana.
Lúcia Helena diz que a dor constante esboça e leva a esse quadro psicológico do paciente fibromiálgico. Ela afiança que a psicoterapia ajuda a perceber os gatilhos. O autoconhecimento, percepção de possíveis traumas relacionados às crises e as técnicas de relaxamento associadas à psicoterapia diminuem as dores.
“Pode ser desencadeada após um trauma psíquico (eventos recentes ou passados, situação prolongada de stress etc.), ou até mesmo físico (traumatismo, cirurgia, acidente de trabalho, de trânsito, um susto e/ou perdas intensas)”, discorre.
Portanto, muito embora exista a indicação de autocuidados e trabalhos com meditação, caminhadas, atividades físicas leves que melhoram o quadro psíquico e físico, tais pacientes são muito resistentes a aderirem a essas indicações. “Mais uma vez, o tratamento psicológico para apoio e ajuda na modificação do comportamento é importante”, conclui.