Cofres Públicos e vidas: a desigualdade salarial nas carreiras públicas
O cenário das carreiras no setor público brasileiro demanda uma análise crítica, especialmente no que diz respeito à remuneração inicial, fator crucial para atrair talentos qualificados. As principais carreiras civis, notadamente Educação e Saúde, enfrentam desafios significativos com remunerações abaixo da média, tornando-se pouco atrativas para a composição de um quadro de servidores engajados nas transformações necessárias para o país.
Um exemplo emblemático é a remuneração de professores, cujo salário, até recentemente, era inferior a três mil reais para uma carga horária de 40 horas semanais, antes do advento do piso básico, ainda ignorado em algumas cidades…
Essa realidade reflete um problema estrutural que se estende à formação de novos profissionais, com a predominância de cursos de bacharelado em detrimento de licenciaturas, resultando em um déficit na formação de professores. A discussão sobre pisos salariais torna-se recorrente, evidenciando a necessidade premente de revisão nas políticas salariais. O dilema se estende à área da Saúde, onde profissionais da enfermagem, essenciais para o atendimento da população, também enfrentam desafios salariais significativos e tiveram a conquista de um piso básico.
A baixa remuneração impacta não apenas a qualidade do serviço público, mas também a formação de novos talentos. Urge, portanto, uma discussão profunda sobre a remuneração adequada para atrair e reter profissionais qualificados. A experiência de Alagoas, a qual vivenciei em 2022, que concedeu reajustes focados nas carreiras mais mal remuneradas, oferece insights valiosos. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) destaca que os 10% de funcionários públicos com pior remuneração representam apenas 2% do total da folha de pagamentos.
A elevação salarial direcionada a esse grupo poderia ter um impacto social significativo, melhorando o serviço público a um custo relativamente baixo. A proposta de reestruturação das carreiras de Estado, visando uma maior uniformização salarial, surge como uma alternativa viável. No curto prazo, a redução das desigualdades internas nas carreiras é crucial, tornando o serviço público uma escolha atraente para talentos diversos. O atual modelo, com distorções previdenciárias e enfoque excessivo nos profissionais em final de carreira, precisa ser repensado para construir um sistema mais equitativo e eficiente.
Em meio a desafios políticos e estruturais, a busca por soluções que promovam a valorização das carreiras públicas no Brasil é imperativa. Como bem disse Graciliano Ramos, “é fácil se livrar das responsabilidades. Difícil é escapar das consequências por ter se livrado delas.” A valorização das carreiras públicas não é apenas uma questão de remuneração, mas um investimento no futuro do país.
Antonio Archangelo é pesquisador, gestor e professor.
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