Elegância: atrás de um imortal kit de bateria, o cara. Atento. Reluzente. Anjo mal sob rompante baco-empático-celestial? O aprumo respeita retina. O caríssimo smoking. Beast of Burden você ouve. Dead Flowers. Duas baquetas em câmera lenta tal o rebento pós shakespeare, vos apresento: é baqueta fina é o bumbo sessentista confronto, total junkie sintonia, celestial estrala Charlie Watts, o músico que embebedou o mundo.
Estilo: Charlie Watts. Estilo: como Charles Bukowski no célebre poema atesta, o estilo celebra. No céu teve festa? Charlie, my honey: você não era imorrível? Digo, insisto: Mick Jagger e Keith Ron Wood aqui comigo: você não partiu, não. Você descansou sambarilove pra valer, dê um abraço no velho Lemmy, pode crêr? Diga ao pequeno Ricardo junto ao venenoso piano sentado: irrompa a inflamável sinfonia pra vingar o firmamento– Miss You, chama o Chuck pra botar sustento Berry fogo assim ferve o salão, enquanto Lennon lê as notícias do Afeganistão.
Legado: Charlie, você é maior que Hollywood. Você colocou Nietzsche pra dançar, Godard. Dança danceiro passo maneiro espirra acqua-lunar ao éter ao terrena saga do banquete: certeiro vejo você ritmo preciso uivantes memórias Last Time Mautner Roberto Piva deixa geléia guiar rascante geral Chacal não evapora hoje o verso o vulto verdejante vamos louvar. Foi-se embora o amigo da canção. E economia, rima com poesia, travessia? Estilo: como disse o velho Elton John, no dia vinte e quatro de são agostinho, era ele o estilo-destino encarnado. Charlotte Gainsbourg agora é pintura veste vinho veste luto triste sina pobre criatura, Charlie.
Substância: do jazz ao rock eterna vernissagem jogando junto interação com a chanson, você colocou o vigor inebriante em cada beat pra nos abraçar, és o caos estonteante era o prometido baile de aurora e depressa você fez a contagem pra todo mundo delirar satiricon à vonts fusão Waiting for a friend deleite verdugo jamais: dá-me teu tímido sorriso eu sei que você leva fácil você ventura rara verdade eu sei que você desempenha na batéra cabra batente baita competente punho veemente constante coragem chefia, tamborzão rolling stones fascina tanque resistência. Você é fera, Charlie. Discreto. Antenado o batuque o prazer o baque – desencarcerado silêncio do gentleman, reservado desfila o terno muito bem cortado. Do boogie woogie ao psicodélico, Bêuzinho pisca o olho, se diverte. É sério, oníricos muros de fumaça Brown Sugar avançam profusa pós-utopia alquimias baudelaire valvuladas especiarias vox nos hotéis claustros ginsberguianos e você agora aos oitenta na moita resolveu ir embora nos vales do sigilo discou o uber pra Pasárgada, Charlie?
O professor Watts pintaria pedalando seus quadros antes do zape. Mão no bolso andante – na breaca sutileza da ribalta, londrinas esquinas que viram Ruby Tuesday duplicar a dose. Persona chiqu em distinta finta pulso prato sinergia discos voadores alienígenas vultos vibrantes em lojas de discos do passado presente futuro, infindas labaredas eletrificadas labirintos novos platôs nos fones dos nossos apaixonados diários, exílios da rotina graças ao furacão rock-era usina fora da tensão moral esfera zero abaixo raso esquadro hipocrisia, décadas assim enquadradas tatuadas serpentes nascem crivam a nova a cabeleira da Medusa, o pagão ritual ruge libertação – bacantes das noites invencíveis quentes e sussurantes estrelas pelo cais from hell cantam Charlie Watts, que não aceita nunca cheque falso, não caduca – deu um “préstenção” – moqueta bifa no Mick na suíte do hotel Cambalacho, Keith salvou pelas pernas o cantor de espatifar-se janela abaixo, que o Charlie arrumou no espelho pós banho a gravata porque só tocava na maior banda de rock do mundo (depois do Ramones) e o Charlie goleirão amarrou coerência e identidade no cadarço das baquetas contra o mundo convenciolanista da pura média-mediocridade, portou-se elegantíssimo até pra morrer silente, cheio de serenidade. Você crê? Ao lado da mulher o derradeiro compasso. Em slow ah, expirou. Não creio. Ninguém acreditou. A notícia nos deixou aos prantos aqui em casa: eu, Teté e Ramone. Sweet Virginia.Wild Horses. Time Waits for No One. Poxa, reouvir Stones happy pranto ouvir sister morphine acalanto: Charlie conquistou evidentemente o meu o nosso submundo em fogosos sonhos foguetes “vamos pra festa” love strong factory girl eis que venceu a verve maldita pra varrer entre overdoses e luxuriosas epifanias a caretice, fomentou carnal revolução em ruas escuras ladrantes infectou rimbaudianas gerações.
Rock and roll: Wim Wenders diz que ‘Satisfaction” explica os anos sessenta. Golaço. Hedonismo e estados alterados da mente, maio de 1968 Cortázar relógio ponteiro eu vou além, os Stones inventaram a roda, amém. Tiveram o start me up pegaram Marvin Gaye e chaparam com Howlin Wolf, Muddy Waters bebe café na sintonia Bo Diddley que ironia os ingleses pegando raízes mixed emotions e os americanos com medo: out of our heads – é a british invasion, transformado você não mais capacho agora você quer alívio sem dorflex, levanta os indicadores, para o alto e rompante joelho pernas avante: que passinhos maneiros tia Pá, embriaguez sem mé diz seu ombro esquerdo dançando dance little sister dance começou o carnaval oba, o tempo perpassa confiante martela o piano beldo o blues rock agradece a pista enlouquece são os Watts versos violentos contra apatia – então enfoque contracultura o poema mais corpóreo sinestésico-sensorial ao vento dionísiaco, long live ao longo ultraje dos true bad boys do rock: Gimme Shelter trovas e loucuras que sequelados lemos anestésica chuva nos tomos quixotescos das roubadas ressacadas editorias existenciais que Charlie Watts benzeu via mutantes vadios poros da civilização.
E que serena grafa galante serenata na baqueta assinatura plena maturando em cidades-concerto recado dado permanecerá – e o recato é do meu agrado também, Charlie. A engenharia de sua pegada a obsessão técnica de análise, ah os meros detratores de araque – quem lê tanta notícia? Nada poderia perturbar o lord. A deselegância nunca roubou não havia atravessão que riscasse tirasse do rosto o sossego do meu amigo Charlie, Benito. Ele era sócio da sobriedade diante da fama boulevard e manjados cegos holofotes. Afinal, como afirma em um documentário que assisti em vhs, alugado na finada locadora Vídeo Show, Rua 3 avenida 2: “eu estava no mictório, prestes a passar pela cortina pra iniciar o show, estávamos todos no toalete urinando e depois de poucos segundos milhares de pessoas estavam gritando nossos nomes, o do Brian Jones, que inclusive mal lavou as mãos, isso é ridículo”. Nada de deslumbre. Só intercepto não-estanque babilônia-alumbramentos estúdio tour, midnight rambler. Nada de vestir a persona alienada adolescente carente birra non grata. Não. Portanto, caro leitor, repita: nunca Watts sentiu-se vigiado, nunca. Morreu reservado como um inverso Brás Cubas na sede de nomeada, neste bioma o emplasto emplacou pôs pra dançar multidões comungando corações envenenados. Porque, não adianta, preciso desse drinque-despedida essa prece você merece, valeu Charlie Watts, outsider, o prazer é todo dinamite todo instante não mais estanque, raivoso desfecho clichê, se me permite: Its’ only rock and roll, but I liked it.
*O autor é músico e escritor: Instagram: @mariomariones. Email: mariomariones@gmail.com