Cantos diversos
A CASA DA NAMORADA
Vendo a casa da Rua 2,
A casa da primeira namorada,
Não mais se vê a do passado,
Está, agora, trincada, desbotada,
De jardins sem cuidado,
De grades sem pintura,
De janelas envelhecidas,
Ocupada por gente ignorada.
A ilusão que nela havia
Foi-se com a água de muitas chuvas.
E quando o tempo virou a esquina
Levou da menina as primaveras.
E quando o tempo voltou a virar,
em outra esquina de outro tempo,
Trazia as cansadas e infelizes quimeras.
A casa da namorada tornou-se velha
Como a menina da ilusão.
E tudo, já de outra realidade,
Acaba escondido nas sombras da noite.
Que cobrem esta mesma e diferente cidade.
AS IRMÃS
As gêmeas, de faces frias,
Entre vários otários,
Viajam sem tristeza e sem alegria
No ônibus dos bancários.
Não se olham nem se falam.
E quando se falam e se olham,
Não se olham nem se falam.
Seguem sempre apressadas,
Não sabendo o que encontrar
Talvez coisas para não se encontrar,
Pois estando afastadas,
Só a solidão podem encontrar.
A ESTRELA
Marilyn
A que foi amada cinematograficamente,
a que encantou os desencantados.
Estrela solitária
No mundo das luzes e das câmeras,
Como se fosse a mais feliz.
Marilyn
Aquela que não foi a que vimos,
Mito de um tempo.
A estrela caiu.
Ela que escondia uma poetisa
Na suicida de Hollywood.
AS RUGAS
Estranha a hora do entardecer.
É um esperar sem ficar.
É um ficar esperando.
Ficar pensando.
Uma indefinição do querer.
Uma tentativa de fuga
De repente na face triste
Do triste olhar.
Uma simples ruga
Que veio sem queimar nem arder
Sulcando sem violência
Mas violentando, no entanto,
A suavidade do ser.