“Acordar com galo e com as galinhas”, foi expressão cunhada na literatura e no linguajar popular para identificar aqueles que acordam cedo. O que não é novidade nenhuma para quem reside no ambiente rural, já acostumado com os sons da natureza, seja um cantar de pássaros, maritacas, ou até mesmo o som mais intenso de chuvas e trovões. Entretanto, sons não tão corriqueiros no ambiente urbano, onde o som de motocicletas, carros e caminhões melhor se encaixa.
É nesse panorama que se encontra um entrevero entre um galo e moradores do bairro Consolação. Nino, nome do galo com pouco mais de 20 centímetros, escolheu morar dentro do Cemitério São João Batista, local que habita há cerca de um ano, depois que seus donos mudaram de casa e ele simplesmente “pulou” para dentro do muro e por ali ficou.
Não seria novidade nenhuma ter animais andando por ali, já que, é possível avistar galinha d’Angola, gatos e cachorro dentro do cemitério, entretanto, o cocoricó do galo vem incomodando alguns. “Recebemos cinco denúncias na Ouvidoria, três delas declaradas [com nome] e duas não. Fomos lá tomar conhecimento do que estava acontecendo”, relatou ao Diário o secretário de administração Rogério Marchetti.
Segundo Marchetti, o galo se acostumou a subir o muro da Avenida 19 e cantar, por volta das 3 horas da manhã, o que incomodou alguns moradores. “Tem umas pessoas com problema para dormir, que trabalham, então tentamos resolver a situação”, disse.
Manoel de Jesus, Chefe do cemitério, explica que tentaram “capturar” o galo. “Ele não quis entrar na gatoeira”, revelou, “e não vamos machucar o bicho, a gente cuida dele aqui”. Para resolver a questão, a solução foi construir um cercado, bem modesto do outro lado do cemitério, com o intuito de fazer com que o galo mude de lado.
“Do outro lado a casa mais próximo é a uns 300 metros, então não deve incomodar ninguém. Os funcionários já se acostumaram com ele, cuidam e até o chamam pelo nome”, acrescente Marchetti. O cercado foi construído com doações, assim como, a alimentação do animal, que recebe todo o cuidado dos funcionários. “A Rosana chama e ele vem correndo, só chamar pelo nome e ele vem, é até bonito de ver”, contou Manoel.
Entre os funcionários a fama do colega gera até ciúmes. “Todo mundo agora vem no cemitério para ver o galo, agora ele ganhou crachá”, comentou um funcionário. O crachá do galo o intitula como “Apoio” e, segundo Marchetti, é uma forma de mostrar que o bichinho é bem-vindo. “Ele não causa dano nenhum, pelo contrário é uma forma de faxineiro, pois come escorpião, formiga, barata etc. A questão do crachá foi mais para uma referência e até um gesto de que ele é bem-vindo. Em um ambiente em que, culturalmente, se vê tristeza, ele traz um pouco de alegria para acalentar os corações”, relatou Marchetti.
ANIMAIS
Mas não é somente Nino que é bem-vindo entre os muros do São João Batista, outros bichinhos recebem carinho especial de funcionários e visitantes, afinal, são cerca de 60 gatos e um cachorro. Amante dos animais, Manoel faz questão de cuidar de todos que por ali aparecem. “Já vi por aqui lebre, canarinho da terra, tem muito bicho que aparece. Se eles vêm aqui é porque é um ambiente bom, tranquilo.”
Anos atrás, foi a vez de Billy, o cãozinho que foi abandonado em uma casa nas redondezas e que Manoel e seu filho resgataram. “No começo ele era bravo, demos comida, fizemos até campanha para levar ele no veterinário, gastamos um dinheiro, mas agora ele está bem e nos ajuda por aqui. Os gatos quem cuida é uma lavadeira, que lava os túmulos, olha, vou te falar, acho que tudo que ela ganha aqui lavando os túmulos, ela gasta com esses gatos. Um deles, o Cido, vai até a porta dela e vem acompanhando ela até aqui. Na época de pandemia foi difícil, fechou o cemitério e começamos nós a tratar dos gatos, mas eles não comiam. Tivemos que fazer um esforço danado, trouxemos ela aqui só para alimentar eles e ir embora. Se ela morrer, esses gatos estão lascados”, observou.
Por Vivian Guilherme / Foto: Divulgação