Passando por uma praça distante do centro da cidade, sorvo o ar puro de uma manhã de fevereiro após a chuva noturna.
As árvores farfalham levemente, soprando um vento bom que refresca o corpo e também a alma.
Noto que os bancos da praça estão vazios, mas um banco mais afastado destoa dos demais. Nele um jovem solitário medita, com os olhos fitos no nada, e o mais incrível: sem nada nas mãos, seja um aparelho celular, uma revista, um livro.
Mais próximo, olho para o rapaz e vejo que ele está com os olhos fixos em algo que não está ali. Provavelmente seus olhos acompanham as imagens da alma, fixando-os em lembranças de algo que se foi, mas que jamais passará em seu coração.
Ou talvez o jovem esteja apenas meditando, algo bem raro nos dias de hoje… Pelo menos para mim, que levo a vida apressada e não me dou chance de parar para pensar, meditar, ou simplesmente deixar a mente vagar pelo nada, como faz o rapaz.
Este pensamento me acompanha pelo que resta do trajeto: por que não satisfaço esse desejo que se esboça? Por que não paro, sento-me a um banco desses e deixo os pensamentos flutuarem ao sabor do vento, como aquela pipa que navega lá no céu azul?
Falta de hábito? Medo de ser assaltada? – me pergunto. E logo a resposta chega: não paro porque tenho pressa… Mas pressa de quê? Sem ninguém me esperando em casa, sem compromisso algum com quer que seja, por que tenho pressa?
Deduzo que tenho pressa porque, desde os 12 anos, tive que trabalhar e ao mesmo tempo estudar, por ser arrimo de família. Parece que isso ficou impresso em mim, como uma tatuagem, e desde então não parei mais. Me mantenho ativa e descansar, para mim, é assistir um pouco de TV no final da tarde, sempre com um trabalho ou o aparelho celular nas mãos.
Embora goste muito de ler, deixo este regalo para alguns quartos de hora antes de dormir. Escrever, então, adoro! Mas ultimamente este lazer raramente ganha lugar em minha lista de afazeres, como se as demais tarefas sejam prioritárias em minha vida.
Espantou-se? Sim, mesmo aposentada mantenho uma listinha de tarefas que só cresce: cuidar das plantas, organizar a casa, lavar o quintal, cozinhar, fazer pão, costurar, ler jornal, ver as mensagens e notícias dos grupos de WhatsApp e do Facebook, pesquisar coisas que interessam no pai Google e outros sites…
Ufa, tudo isso me deixa cansada e sem espaço para realizar sonhos que me parecem tão grandes, como ter meu próprio blog, concluir os livros que iniciei em um intervalo dessas tarefas, deixar respirar e fluir o meu eu…
Meu eu… Acho que cheguei no âmago da questão. Por que sufoco meu eu? Penso, penso, e chego à conclusão que não paro porque tenho medo. Medo de encarar meu eu e acordar as dores sofridas… Medo de encarar meus fantasmas e senti-los vivos dentro de mim.
Todo mundo tem dentro de si uma caixa de Pandora. Se sinto inveja de um jovem que tem tempo de sentar-se a um banco da praça e meditar, é porque chegou a hora de abrir esta caixa e pôr para correr os fantasmas que nela habitam.
É chegada a hora do exorcismo, de renovar os ar desta catacumba em que me transformei, sentar-me no banco da praça e, tal qual a pipa, alcançar as nuvens. Sem lista de afazeres, sem celular, sem pressa, pois a vida é agora. E ela sim, passa depressa como aquelas nuvens lá no céu…
Se lembrássemos mais vezes de como é bom tirar um tempo para refletir, por certo faríamos isso mais vezes amiga. Refletir aclara os ideais, aponta caminhos e acalma a alma. Obrigado por compartilhar conosco sua opinião. Abraços.
Reflexão maravilhosa Nilce Franco, preciso muito arrumar tempo para me sentar em alguma praça e meditar, continue sempre à nos presentear com suas escritas, eu adoro, beijos!