Bilhetes de um tempo
[XIII]
E quase todos aqueles meninos do bairro eram também alunos do inesquecível e histórico “Joaquim Ribeiro”.
No pré-primário, a professora Antonietinha era a nossa comandante. Pessoa meiga, falava baixinho, parecia irmã de freira, sempre calma, com um leve sorriso nos lábios. Muitas histórias da infância ela contava para quem se encontrava vivendo a melhor quadra da vida. Não é impossível recitar:
“Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!” (Meus oito anos)
Assim, declamava o amado Casemiro de Abreu, de tão curta existência, e que foi o primeiro poeta que conheci na minha vida.
Depois veio a professora Cleusa, a nossa segunda mãe. Tranquila e sempre afável. E foi a que, verdadeiramente, nos alfabetizou. Do livro que ela fazia uso tenho à lembrança a primeira lição ‘A pata nada pata pa nada na’”.
Dessa sala me lembro das meninas Carmem Sílvia (sobrinha da professora Antonietinha), a Beatriz Buschinelli, a Elisabete Rubio Duarte, a Elizabete Chadad, a Maria Aparecida Pascoal, a Alba Barsotti (1º lugar da turma nesse ano), a Leontina (menina que se sentava no fundo da sala e parecia sempre triste). A Leontina sentava-se à frente do Leonel, bem mais velho que a gente, e teria vindo do sítio, e dependia pra ver de um só olho; mais atrás sentava-se o Robertinho, que foi o maior craque da bolinha de gude – ninguém teve mais precisão do que ele na mira para acertar a bolinha adversária, fosse curta ou longa a distância. Impressionante).
[XIV]
De outros colegas me lembro do Geraldo Massaro (palmeirense e com quem tive a maior proximidade naquela época) do Amadeu, do Pita, do Reginaldo (voz de trovão), do Ulisinho, do Mário (primo do Ariovaldo Brunelli), do Tite (ótimo aluno em Matemática),
A Dona Anita, também excelente professora, foi quem deu aula para nós no 2º e 3º anos do Primário. Agora, não tenho certeza se foi com ela ou não o seguinte caso. Fui colocado de castigo – por falar muito, acredito – atrás do armário que ficava enviesado na parte da frente sala de aula. E lá, para minha sorte, encontrei duas borrachas praticamente novas. Então, não recebi um castigo; recebi um prêmio. Ironias da vida.
Por fim, surgiu em nosso caminho a estimadíssima professora Alicinha, do 4º ano primário, mãe do Geraldo, médico, e do Cássio, do Ministério Público Estadual.
De personalidade forte e justa, enfrentou a generalíssima Ana Alice, então diretora, sempre elegante e altiva, que não iria me deixar receber o diploma no final do curso primário. Castigava-me, assim, pelas traquinagens. Recebi o diploma como todos e com todos os alunos. Reconheço que, como eu fui menino daquela rua 5, não era fácil me aguentar. Porém, minhas notas eram boas. E, por isso, digo que a professora Alicinha foi justa comigo, nesse ponto. Fica aqui o meu preito de gratidão mesmo que intempestivo. Que tempos!
[XV]
Lembro-me que eu morava numa casa geminada. Meu pai pagava aluguel. Desse tempo, fala o poema que segue:
Minha memória não falha
Quando o olhar, vendo chuva cair,
Revive a chuva que caía
E escorregava, provocando na calha,
Um som gostoso, bom pra dormir.
Casa pobre de quarto à frente
Que da janela se via o jardim
E o portão, quebrado, por onde se saía,
Ganhando a rua de terra da gente.
Que tempo! Mas, fugiu de mim.
O mundo era aquele pedaço de chão
Poético demais pra negar o sonho
Desta vida que, aos poucos, se diluía,
Deixando no peito aguda aflição
E, no rosto, um semblante tristonho.