5 letras. A primeira é M. Joga com a perna esquerda. Muitos recordes e prêmios individuais (“melhor do mundo” seis vezes e “melhor da Copa do Mundo”, tanto no sub-20 quanto no profissional), mas sem nenhuma grande conquista com a seleção de seu país – obteve três vices consecutivos. Perdeu um pênalti decisivo com a camisa do selecionado em 2016.
Estamos falando de Messi? Não, de Marta.
As semelhanças, como se vê, são imensas – poderíamos acrescentar: enormes dificuldades na infância/adolescência (pobreza, doença, preconceito). Além disso, até aqui ambos só marcaram gols de pênalti nas competições que estão disputando paralelamente. A seleção brasileira se classificou na terceira posição, e a equipe argentina não deve conseguir mais do que isso.
Há, porém, algumas diferenças cruciais.
A visão da imprensa nacional é unânime: Marta é “a Pelé” do feminino – aliás, Edson é quem foi “a Marta”, como recentemente afirmou Juca Kfouri. Para ela, a escassez de títulos “de ponta” (Olimpíada e Copa do Mundo) pela seleção em nada afeta a analogia. Aliás, as conquistas coletivas de Marta no âmbito de clubes são bastante modestas comparadas às do rei e mais ainda às de “la pulga” Messi.
Desse modo, temos um mesmo peso com duas medidas diferentes: Messi “não pode” ser comparado a Pelé – e há quem diga que ele não deve nem mesmo ser lembrado dentre os maiores – porque… não tem grandes conquistas com a seleção.
Pouco importa se ele é, também, o maior artilheiro da história de sua seleção e se tenha sido peça mais do que fundamental nos melhores resultados obtidos pela albiceleste no último quarto de século.
O argumento pró-Marta se baseia no oposto: ela até fez mais do que se esperava ou se podia fazer. Messi? Deveria ter feito (bem) mais.
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Qual a justificativa para essa contradição? Marta se tornou tudo o que se tornou exclusivamente por talento e perseverança: “seria fácil ser um fenômeno como ela nos EUA, onde há investimento gigantesco e o esporte desperta grande interesse”, complementou o supracitado Kfouri.
Thierry Henry, na véspera do confronto Brasil e França na Copa de 2006, disse: “Eles [brasileiros] jogam o dia inteiro, na praia, na rua… Eles nascem jogando futebol. Quando eu era pequeno, ia à escola das 8h às 17h, e minha mãe não me deixava descer para jogar”.
Será justo analisar assim? Pela lógica, portanto, é mais fácil ser um fenômeno do futebol masculino no Brasil do que na Europa. Aliás, o que dizer da Holanda, 205 vezes menor que o Brasil, mas que produziu Cruyff, Van Basten, Gullit e Bergkamp, para ficar só nas lendas?
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O objetivo aqui não é desmerecer ou diminuir Marta. Novamente, quero convidar o leitor à reflexão. A imprensa alardeou que ela superou o recorde de Klose em Copas. Não. Não é possível se comparar o futebol feminino e o masculino porque um é praticado há 150 anos, o outro ainda é recente – mesmo nos EUA e países já tradicionais no desporto, como Alemanha, Suécia, Noruega ou Austrália. Aliás, exceção feita à Alemanha, nestes outros o futebol masculino é de terceiro escalão.
Tão injusto quanto comparar estatísticas frias, é a visão salarial: Marta e as outras craques mundiais ganham dezenas de vezes menos do que os grandes nomes masculinos. Isso pode ter sua raiz na desigualdade de gênero, mas tem muito que ver com retorno de investimento: mesmo nos países supracitados, muitas jogadoras sequer recebem salário devido às ridículas médias de público.
Não esqueçamos: o salário de Marta é superior à quase totalidade dos jogadores profissionais que atuam no Brasil.
*** Em tempo: a Pelé, a rainha do futebol, é a americana Mia Hamm. Marta é, no máximo, a Messi.