As mãos que um dia dedilharam com maestria as cordas, arrancando harmonias que embalavam corações e histórias, agora repousam em silêncio. O som dos acordes que por décadas ecoou pelos cantos de sua oficina e pelos palcos da vida não mais será ouvido. Ao menos, não por aqui. José Guilherme, o Seu Zé, fundador da JOG Instrumentos Musicais, partiu aos 102 anos, deixando para trás um legado de música e paixão que atravessou gerações.
José Guilherme faleceu nesta quinta-feira dia 10 encerrando um ciclo de dedicação à arte e à excelência. Sua marca, a JOG, criada em 1959, forneceu instrumentos de alta qualidade e também colocou Rio Claro no mapa da música nacional. Com uma vida inteira dedicada à música, Seu Zé transformou sua empresa em um símbolo de tradição e inovação, sendo lembrado tanto por sua habilidade como músico quanto por seu espírito empreendedor.
Viúvo de Ivone Hofling Guilherme, José deixa os filhos Rui, Flávio (casado com Cláudia) e Luiz Fernando (casado com Cristina), além de cinco netos e cinco bisnetos. A despedida ocorreu ontem, no Memorial Cidade Jardim, com sepultamento no Cemitério Evangélico.
Aos 100 anos, Seu Zé concedeu uma emocionante entrevista ao Diário
Ele relembrou sua trajetória que começou na década de 50. Naquela época, um emprego na Cia. Paulista de Estradas de Ferro e o cargo de professor na Escola Ferroviária eram símbolos de prestígio. Entre os seis irmãos, quatro seguiram a carreira ferroviária, enquanto José descobriu cedo sua paixão pela música, aos dez anos, ao tocar um cavaquinho pela primeira vez.
Aos 15, José conheceu o violão, instrumento que se tornaria seu companheiro para a vida toda. Em 1947, durante um curso no Rio de Janeiro, ele teve a oportunidade de aprender com o renomado Dilermando Reis. Mesmo já tocando de ouvido há anos, esse contato marcou uma nova fase em sua vida musical. Nessa época, começou a fabricar acessórios para instrumentos, como chaves de piano e vibrafones, vendendo seus produtos em São Paulo.
A fabricação de instrumentos foi crescendo, e a demanda pelos acessórios aumentou tanto que José abriu sua própria fábrica no quintal de casa, com o apoio dos irmãos. A loja veio logo depois, inaugurada no mesmo quarteirão onde morava. Aos poucos, os filhos começaram a assumir o negócio, mantendo a tradição familiar.
Com o tempo, a JOG expandiu e passou a vender produtos eletrônicos e até bicicletas, mas sempre manteve o foco nos instrumentos musicais. A marca se tornou referência, especialmente nas fanfarras e orquestras do país, que utilizam liras, vibrafones e marimbas fabricados por José e sua equipe.
Mais de 60 anos após a fundação da JOG, José continuava tocando seu violão, sempre no cantinho esquerdo da loja, embalando o ambiente musical que ele próprio havia criado a partir de um sonho. Foi assim até ontem.
Foto: Diário do Rio Claro