Olá amigos. Escrevo aqui da Hungria, onde estou com a F1, mas bastante atento às notícias de ciências que surgem no mundo. E como o nosso tema aqui é preferencialmente ciência, exceto quando aquela excrescência chamada Gilmar Mendes defende os interesses de gângsters, e seus também, não há como não falarmos hoje do que parece ser uma descoberta importante: água líquida no subsolo de Marte.
A importância da descoberta, a ser confirmada, é grande por elevar à possibilidade de encontrarmos formas de vida no planeta vermelho. Você não ficaria feliz se descobríssemos vida fora da Terra? Já imaginou o impacto? Não há cidadão no universo da ciência que não acredite nisso, a questão é apenas detectá-la. Estamos falando em formas de vida das mais simples, bem entendido, hein? Seres inteligentes capazes de desenvolver tecnologia é outra história.
O grupo de astrônomos italianos liderado por Roberto Orosei, do Instituto Nacional de Física, em Bolonha, utilizou na pesquisa o instrumento Marsis, um radar, da sonda Mars Express, da Agência Espacial Europeia (ESA). A sonda orbita Marte. Através do estudo do retorno dos pulsos de radar emitidos por Marsis, os físicos, químicos, astrônomos, astrobiólogos envolvidos na pesquisa concluíram existir sob o polo sul de Marte, a cerca de 1,5 quilômetro de profundidade no gelo, um grande lago com água em estado líquido e diâmetro de 20 quilômetros.
Não representa algo novo para a ciência. Aqui na Terra, sob as camadas de gelo do polo sul, através da mesma técnica já detectamos cerca de 400 lagos de água líquida submersos. O maior deles é o lago Vostok, localizado a quase 4 mil metros de profundidade, ocupa uma área de impressionantes 15 mil quilômetros quadrados e tem, em média, 600 metros de profundidade. Agora o mais importante: pesquisas relativamente recentes descobriram espécies de bactérias no lago Vostok e até seres multicelulares, espécies de fungos, surpreendendo os biólogos.
Há semelhanças importantes entre o lago encontrado em Marte e os que já existem na Terra em condições parecidas e onde há vida. Importante: tudo não passa de um indício de que pode haver formas de vida nesse lago marciano. Existem vários outros fatores que conspiram contra o seu surgimento, como o nível de salinidade, pois para chefe do estudo, Orosei, a água tem de ser salgada, como no Vostok, para se manter em estado líquido.
Enquanto a água doce congela a zero grau Celsius, no nível do mar, a água congelada exige bem mais frio, é mais resistente ao congelamento. Como o estudo do retorno dos pulsos de radar sugerem fortemente a presença de água em estado líquido sob o gelo, essa água tem de ser salgada, pois a temperatura lá em baixo atinge muitos graus abaixo de zero. Há outros parâmetros que levam a essa suspeita.
O grupo de Orosei acredita que o lago é um dentre tantos que devam existir nessa região do polo sul marciano chamada Planun Australe. É bem possível que seja como na Terra, onde há muitos lagos de água líquida sob a superfície congelada da Antártida.
A descoberta cria grandes perspectivas de mandarmos novas missões a Marte para explorar o lago? Pouco provável. Há pesquisas mais aprofundadas de outros locais no sistema solar ainda mais promissores para detectarmos formas de vida e, importante, sem ter de perfurar, em outro planeta, um quilômetro e meio de gelo para chegar na água líquida. Hoje é inviável.
A Nasa tem em curso o projeto Europa Clipper a ser lançado em 2020. Trata-se de uma sonda que orbitará a lua Europa de Júpiter, pois há sob sua camada de gelo na superfície um oceano imenso de água salgada em estado líquido. E essa água por vezes é lançada no espaço, como um gêiser.
A sonda vai voar baixo para detectar esses vapores de água, estudar sua composição e verificar se há formas de vida, além de ter uma série de instrumentos bem mais sofisticados que os do Mars Express, por representar uma nova geração da tecnologia. Você concorda que é bem mais fácil recolher essa água pulverizada naturalmente na atmosfera de Europa do que fazer um perfuração de quilômetros?
A Nasa planeja, ainda, enviar uma sonda para estudar Encélado, lua de Saturno. A notável sonda Cassini, que de 2004 a 2017 orbitou Saturno, detectou gêiseres de água lançados por recortes na camada de gelo da superfície. A química dessas águas, do lago descoberto em Marte e dos oceanos de Europa provavelmente é bem parecida.
Os astrobiólogos sempre dizem, hoje, quando o assunto é descobrir formas de vida fora da Terra: “Estamos quase lá”.
Por Livio Oricchio
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