Saímos da era industrial já há um bom tempo. Hoje se vive a era do consumo, como gostava de falar o sociólogo Zygmunt Bauman, com uma fragmentação da nossa vida social.
Os padrões, quase todos foram rompidos e há uns poucos ainda a romper. Vivemos na era do sujeito pós-kafkiano. Em toda sua obra, o escritor Franz Kafka retrata cenários sombrios nos quais os personagens quase sempre são vítimas de um mundo administrado verticalmente.
Gregor Samsa, o mais conhecido deles, acorda um belo dia, após sonhos intranquilos, e vê-se transformado em uma barata. Uma metáfora poderosa que o autor desenvolve ao longo do livro. Numa análise bem simplista, A Metamorfose mostra que um cotidiano opressor levou Gregor àquele destino trágico.
Se antes éramos vítimas do sistema, hoje num mundo mais plano, de relações mais horizontalizadas, somos muito mais vítimas de nós mesmos. Quantas vezes você justificou a não realização do seu desejo e nem sequer tentou ir em direção a ele? Quanto nos arriscamos em busca daquilo que realmente queremos?
O mundo do qual nos despedimos pedia que fizéssemos aquilo que Sartre definia como o “projet de la vie” (projeto de vida). A ideia era selecionar um plano de vida e ir seguindo passo a passo, ano após ano em busca dele sem se desviar do caminho. No trabalho, almejava-se ficar por vinte, trinta anos e aposentar. Uma carteira de trabalho com muitos empregos era sinônimo de incompetência profissional.
Tente falar sobre isso a um adolescente hoje e ele rirá de você. Justamente porque a grande marca desse mundo pós-revolução industrial está justamente na mudança acelerada das coisas e na capacidade de nos adaptarmos a elas.
Hoje, temos grande dificuldade em planejar as coisas para o ano que vem, quanto mais elaborar um projeto linear para, digamos, uma ou duas décadas. Temos constantemente que redefinir nossa identidade, profissionalmente, nos relacionamentos, na vida em família. E de preferência, sem as nostalgias de um passado idealizado, mas com a força para inventar um futuro.