Vem de muito longe uma polarização de ideias e opiniões que vai muito além da política partidária que temos hoje. É uma polarização milenar, responsável, inclusive, por muitas guerras. A religião e suas mais variadas manifestações. O ódio que gera conflitos mortais, amparado nas diferenças religiosas, nasce da convicção burra de que aqueles que têm uma crença diferente da nossa em relação à fé, os que acreditam de modos diferentes, estes estão profundamente equivocados, são tolos, ou ainda são “infiéis” que nem merecem viver.
Além do radicalismo cego de organizações terroristas de viés muçulmano, como o Estado Islâmico ou Al-Qaeda, há exemplos cotidianos que parecem mais amenos, mas igualmente sintomáticos e intolerantes. De um lado, alguns ateus pensam naqueles que acreditam em Deus e professam uma religião como tontos infantis, sempre à procura de um Pai num jogo de culpa, punição e recompensa. Por seu lado, crentes veem em alguns ateus a imagem do que não é bom.
Essas intolerâncias do dia a dia são distorções culturais que precisam ser repensadas, para o bem da humanidade. É uma reforma a começar em nosso interior.
O que existe de fato é todo um espectro de modalidades da fé humana com o radicalismo ocupando os extremos dos pólos.
Pode não haver, por exemplo, nenhum conflito entre ser cristão e ser cientista. Para estes, e aí me incluo, a prática científica pode ser um modo privilegiado de se admirar e descrever a obra divina em um nível profundo de detalhes. Ou seja, descobrir o mistério do Big Bang, da origem e evolução do Universo, ou mesmo a Evolução das Espécies, por exemplo, também pode ser uma forma de admirar, uma devoção religiosa.
Pais da ciência moderna, como Galileu, Copérnico, Descartes, Kepler, Newton, compartilhavam desse sentimento. O rompimento entre ciência e religião aconteceu com muita força no século 18 com o Iluminismo.
Para os ateus mais radicais, como o biólogo inglês Richard Dawkins, a ciência e a religião são incompatíveis. Há também quem defenda que ciência e religião não se superpõem. O biólogo americano Stephen Jay Gould afirma que “a religião começa onde a ciência termina”. Essa cômoda posição, porém, não se sustenta por muito tempo, pois, à medida em que a ciência avança, a fronteira entre as duas vai migrando.
É a antiga teoria conhecida como “Deus dos Vãos”. Sob esse ponto de vista, a religião vai preenchendo apenas aquilo que a ciência ainda não respondeu. Um bom exemplo é o Big Bang. Alguns afirmam: “Tudo bem, houve uma explosão a partir de um ponto muito quente e de densidade infinita que deu origem ao Universo.
Mas, Deus pode ter criado esse ponto”. Parece ser uma posição um pouco indigna para Deus, já que o espaço que tem-se para a crença parece diminuir cada vez mais à medida em que entendemos mais sobre o mundo natural. De medida mais ampla, a fé pode, sim, se manifestar em algo mais abstrato que a nossa ignorância temporária sobre determinado fenômeno natural.
Ciência, religião e arte se superpõem, convivem na mente das pessoas, nas escolhas que fazemos, nas intuições que temos, no sentir a vida para além da Biologia, da Física, da Química. Afinal, em tempos de polarizações tão evidentes, até mesmo o ateu pode ser visto como um religioso convicto, já que o ateísmo é a crença na não crença.
Negando categoricamente a possibilidade da existência de Deus, ele não se ampara de modo algum no método científico. Vale lembrar que a ciência só pode negar categoricamente a existência de algo depois de muitas observações que sejam absolutamente conclusivas.