A vergonha de uma nação
Mozart …Mozart! …Mozart?! .
És tu?! … És tu Mozart?! …
Onde estiveste? …
Onde ficaste escondido,
meu brilhante Mozart ?!…
… um dia, quando a leve brisa
Sensibilizava as folhas do lugar
e a névoa compunha tristes e
misteriosas imagens de medo e de arrepio,
envolto em lençóis retorcidos,
foste lançado na terra fria,
no teu último pedaço,
como um cadáver qualquer.
E, ali, irreconhecivelmente ficaste,
na vala comum,
entre tantos outros abandonados,
também coberto por cal
e panos encardidos.
Tudo muito triste…
tudo muito humano…
Feias imagens de cemitério,
meu caro Mozart ! …
Feias imagens de cemitério…
Mas, o teu corpo… onde lançaram ? …
onde ficou teu corpo guardado,
meu jovem Mozart !…
Os anjos não o recolheram, bem sei.
As prostitutas não vieram buscá-lo.
Já sabemos.
E os amigos, esses egoístas,
não se apiedando de ti
acabaram também se esquecendo de ti.
E não sei de nenhuma história de abutres,
de cães e ladrões!!
Mas onde eles lançaram os teus restos,
o que de ti haveria de apodrecer
como tudo?
O que de ti era igual a todos?
Onde eles deixaram o pouco
que sobrou de ti,
o que acabou, por fim, se misturando
às raízes dos campos,
às raízes de dentro da terra,
impregnando-te do pó indecifrável?
… e ninguém viu teu rosto se decompor,
nem desaparecer o teu olhar
nas sombras pesadas da terra,
nem estarem expostas
as tuas mãos mágicas e sonhadoras
à fome do tempo e da morte.
Sabe-se que ali, em algum lugar, a nação
perdeu o teu corpo desprezado,
ali, na cova desconhecida
do perpétuo segredo!
Ninguém nunca mais soube de ti,
meu infeliz Mozart.
Ninguém, mesmo depois daquele dia,
em que a névoa, sensibilizada pela brisa,
se retorcia, compondo
misteriosas imagens feias de cemitério.
Só que ficaste guardado,
esquecido, no chão frio
entre panos e cal, abandonado
na vala dos ignorados,
Tudo muito triste…Tudo muito humano…
Mas, a música, a que veio de ti, vibra, ainda.
E vibra, ainda, agora,
Acabaste infelizmente envolto em lençóis…
esquecido…guardado no chão frio… abandonado…
coberto por barro e pedras
na cova desconhecida do perpétuo segredo…
em silêncio…
Onde estiveste, assustado Mozart?
Onde estiveste?
Vê-se uma sombra logo ali?
Parece pisar, sem cuidado, a terra.
E, ali, as folhas úmidas.
E, além, entre névoas,
uma silhueta de sombra, apenas,
vagueia em busca
da cova desconhecida
do perpétuo segredo ?!…
Mozart, és tu ?
Em silêncio, o vulto parece ir
pra onde ninguém sabe.
E, ao final do dia,
as sombras crescem com o anoitecer.