Olá amigos. Escrevo de Zurique. Quarta-feira vou de carro para Hockenheim, na Alemanha, 340 quilômetros ao Norte, local da próxima etapa do campeonato da F1.
Li nos sites de ciência que costumo acessar, embora o tema tenha sido notícia na mídia de modo geral, que o professor Frank Maixner, da Universidade de Bolzano, na Itália, descobriu, desta vez em maiores detalhes e precisão, o que o Homem do Gelo comeu antes da sua morte.
O tema é interessantíssimo. Se você ainda não sabe, no dia 19 de setembro de 1991, o casal de montanhistas alemão Helmut e Erika Simon caminhavam pelos Alpes, na fronteira entre a Áustria e a Itália, quando depararam com um cadáver no gelo. Muitos alpinistas morrem e mesmo desaparecem, surpreendidos por fortes nevascas. É o que eles pensavam quando chamaram a polícia.
O que o casal de montanhistas e as autoridades sequer imaginavam é que aquele homem encontrado no gelo, ou o Homem do Gelo, é a mais antiga múmia já localizada, ao lado da múmia egípcia Ginger, encontrada próxima a atual Luxor, no alto Nilo, a 600 quilômetros ao sul do Cairo, ainda em 1896.
Idade de Ginger e do Homem do Gelo? A datação pela técnica precisa do isótopo 14 radioativo do carbono, definiu que eles viveram há impressionantes 5.300 anos. Como o Homem do Gelo foi descoberto no Vale de Ötzal, no Alto Ádige italiano, e os habitantes locais se referem à região carinhosamente como Ötzi, o Homem do Gelo passou a ter nome, Ötzi.
Desde a sua descoberta vários grupos de cientistas já realizaram os mais complexos estudos sobre Ötzi. Isso porque ele também tinha consigo todos os utensílios que usava para sobreviver, como sua indumentária para enfrentar o frio, as armas de caça, a mochila de abrigar alimentos, os recursos naturais para produzir o fogo e até plantas para aliviar dores provocadas por doenças, dentre outros.
Passamos a ter uma visão real sem precedentes dos hábitos do homem primitivo no fim do Período Neolítico, que se estende do século X ao III antes de Cristo. Nessa época, o homem já dominava a agricultura e mesmo derretia o cobre e o ferro para a produção de ferramentas. Ötzi está incrivelmente bem conservado.
Vale a pena refletir sobre o dado a seguir. A múmia mais famosa do mundo, provavelmente, é a do jovem faraó egípcio Tutancâmon, cujo túmulo foi descoberto intacto em 1922. Tutancâmon viveu de 1.327 a 1.347 antes de Cristo. O que isso quer dizer? Que quando os egípcios fizeram sua máscara mortuária de ouro e colocaram na sepultura no Vale dos Reis, também próximo a Luxor, tudo o que o faraó precisaria na outra vida, Ötzi já estava sob o gelo há nada menos de 2 mil anos! Ficou mais claro, agora, a importância de Ötzi? Ele é uma peça fundamental do mosaico da nossa evolução.
A pesquisa coordenada pelo professor Maixner sobre o que Ötzi comeu antes de perder a vida foi divulgada na última quinta-feira. Outros estudos já haviam dado boas pistas de sua alimentação. A novidade, agora, é a técnica usada. Seu grupo combinou a microscopia clássica com modernas análises que usam corrente elétrica para identificar a composição residual dos tecidos. A pesquisa avançou também no campo da genética, exame do DNA.
Os cientistas da Universidade de Bolzano descobriram que Ötzi comeu uma grande quantidade de gordura animal, proveniente de carne de veado e de uma espécie de cabra que vive nos Alpes, chamada íbex. Ötzi se alimentou também do que imagina-se ser um tipo de pão primitivo, pois foi encontrado trigo selvagem e até vestígios de uma samambaia no seu estômago.
A pesquisa revelou que Ötzi não tinha maiores cuidados em preparar os alimentos, como fazemos, ao cozinhá-los, por exemplo, para facilitar a digestão. A carne de veado e de íbex foram consumidas frescas, talvez secas. Não ficou claro se os esporos de samambaia foram ingeridos de forma consciente ou contaminaram os alimentos. Tudo no Homem do Gelo será estudado novamente.
Quem desejar vê-lo deve ir a Bolzano, no Norte da Itália, onde foi criado um museu especialmente para preservar sua incrível história que, no fundo, é a nossa história. Se você desejar assistir a um vídeo bem produzido, rico em detalhes, em português, sobre Ötzi, recomendo acessá-lo através do enorme link abaixo. Abraços.
Por Lívio Oricchio