Nos anos 80, Erasmo Carlos (em parceria com Roberto Carlos) lançou a canção “Pega na mentira”.
Na letra, de tom irônico e bem-humorado, os compositores retratam uma triste realidade do Brasil. Eles dizem, por exemplo, que viram Papai Noel na favela, que o carnaval passou a ter só um dia, e que acabou-se a inflação. Tudo isso soava absurdo para a época, e continua assim. No entanto, há quem acredite e compartilhe. Hoje, são as fake news.
Com o advento e evolução da comunicação através da internet, a circulação de notícias teve um aumento bastante significativo. Nunca foi tão fácil ter acesso a tantas informações. E tudo ao mesmo tempo, quando e como desejar. Por outro lado, nem sempre essas informações são verdadeiras, uma vez que não há uma fiscalização e elas se propagam a todo instante.
Fake news são notícias e informações falsas, ou que sofreram modificações, veiculadas na internet – maiormente – com o desígnio de manipular pessoas e eventos. Durante essa campanha eleitoral, nunca se viu tantas notícias infundadas sendo propagadas a esmo.
O Diário do Rio Claro conversou com jornalistas que sempre primaram pelo bom jornalismo para que opinassem a respeito desta verdadeira praga contemporânea. Antonio Carlos David Chagas, professor e jornalista, afirma não entender por que se deseja saber tanto sobre isso quando, na verdade, pouco ou nada deveria importar. “É que as fake news se multiplicam com a velocidade da luz revelando a fraqueza humana de tudo desejar saber a respeito de todos, em especial, notícias torpes.
Pobre de quem aceita e compartilha o falso e duvidoso. Revela ser leitor empobrecido, espírito mesquinho, desconectado da realidade”, desabafa. Para Chagas, “enganar-se pode acontecer uma ou outra vez, agora, aceitar tudo o que vem de forma gratuita e rápida e ter prazer na mentira, é para quem, desprovido de discernimento, se enamora do espírito do mal e quer vê-lo disseminado”.
“Os bem-aventurados tenderão a deixar passar alguma verdade a cair no embuste”, pondera o jornalista, que possui ampla experiência como redator e como educador. Por fim, afirma que o valor da informação e o futuro do jornalismo estão intimamente relacionados. “É preciso apostar na qualidade da informação”, finaliza.
Melissa F. Molina Campagnone, atualmente editora-executiva da Bandnews TV, e que teve brilhante passagem pela imprensa rio-clarense, diz que nunca se ouviu falar tanto em fake news, já que elas estão em todo o lugar: na TV, no rádio, nos jornais e, principalmente, na internet. Para a jornalista, é ali, no ambiente digital, que elas circulam com maior rapidez. “Hoje, as redes sociais são uma das maiores fontes de notícias para os brasileiros. Só que a falta de uma fiscalização adequada permite que notícias falsas ganhem cada vez mais espaço no ambiente digital. Os boatos atingem inúmeras pessoas e em pouco tempo”, discorre.
Melissa assegura que as consequências tendem a ser bastante nocivas. “A repercussão é grande também, geralmente fugindo do controle. Essa divulgação desenfreada e impensada, pode causar danos incalculáveis. Um deles, é a desinformação. E podemos ir mais fundo. Postagens falsas podem acarretar prejuízos morais, financeiros e até causar mortes”, ajuíza a profissional, que acrescenta que, para ela, o fato de compartilhar algo sem a devida apuração, configura uma total ausência de senso crítico do brasileiro.
A jornalista salienta que, para evitar que declarações falsas sigam adiante e sejam veiculadas como verdade absoluta, é importante que cada um tenha consciência social. “É saber filtrar aquilo que recebe diariamente. É verificar a origem das notícias, buscar fontes confiáveis, desconfiar e, sobretudo, questionar e pensar. Algo possível”, afiança.
Klaus Lautenschlaeger, jornalista com dez anos de atuação na mídia da região e analista de marketing, também atendeu à reportagem do Centenário. Lautenschlaeger salienta que existem maus profissionais em qualquer ramo de atividade, mas a era das fake news pode ser encarada como um sintoma da banalização que a profissão de jornalista sofre desde a queda do diploma como necessidade básica para exercê-la. “Hoje em dia, qualquer um publica o que bem entende, descompromissado com os fatos.
Em dias como esses, a credibilidade do verdadeiro e isento jornalismo se faz essencial e deve ser buscada de forma constante e exclusiva por quem não deseja ser enganado”, expõe o jornalista. Evocando o refrão da canção mencionada no início desta matéria, fica a sugestão para os jornalistas e, principalmente, para o querido leitor. “Pega na mentira, corta o rabo dela, pisa em cima, bate nela.”
Por Murilo Pompermayer