A Polícia Civil concluiu inquérito que apurava as causas do acidente envolvendo um ônibus no dia 18 de julho de 2021 registrado na SP-310 Rodovia Washington Luís, em Rio Claro. O ônibus de placas JZB-9262, capotou em uma ribanceira no km 184 (sentido norte) vitimando fatalmente Lucilene Maria de Oliveira, Cicero Rubismar da Silva e Rosa Caetano Nelo, bem como ferindo outros tantos passageiros. O Diário do Rio Claro teve acesso ao documento assinado pelo delegado Matheus do Prado Oliveira, responsável pelo caso. O trabalho de investigação concluiu que o motorista e proprietário do veículo cometeu os crimes de homicídio culposo na direção de veículo, lesão corporal culposa na direção de veículo automotor e por fuga de local de acidente, como segue abaixo na íntegra.
CONCLUSÃO
As investigações concluíram que: “Diante de todos os fatos apresentados esta Autoridade Policial formou sua convicção. De início até se pode pensar que o ocorrido foi uma grande fatalidade, já que a barra de direção quebrou, ocasionando o acidente. Entretanto, os elementos colhidos, principalmente com relação ao chassi pertencente ao ônibus de placas ICL8813 (acidentado gravemente no Peru), que não deveria, em hipótese alguma, ser instalado em outro veículo, indicam que o cuidado com a manutenção do ônibus envolvido no acidente era inexistente, demonstrando a negligência do motorista. Além disso, os elementos que orbitam o fato principal desabonam e muito o motorista (como a CNH vencida, a falta de registro do veículo nos órgãos de controle, ter o motorista uma agência de viagens clandestinas etc). Nada do que se é exigido pelas normas de segurança de trânsito no que tange ao transporte de passageiros era cumprido.
Assim, evidente que o condutor cometeu os crimes de homicídio culposo na direção de veículo. A conduta do motorista resultou na morte de Lucilene Maria de Oliveira, Cícero Rubismar da Silva e Rosa Caetano Nelo. Ficou constatado que o motorista cometeu também os crimes de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, tendo resultado em lesão corporal de outros passageiros e fuga de local de acidente – restou evidenciado que o motorista fugiu quando do acidente, visando se eximir das responsabilidades. Uma testemunha narrou, em seu depoimento, que viu o exato momento em que o condutor sai do ônibus, fugindo na sequência. O motorista foi indiciado indiretamente tendo em vista que não compareceu quando intimado.”
O ACIDENTE
Policiais Militares foram acionados via base da Polícia Rodoviária para socorrer vítimas de um acidente de trânsito envolvendo um ônibus. Quando lá chegaram se depararam com um ônibus capotado e várias vítimas. No local já estavam viaturas dos Bombeiros, ambulâncias do SAMU e carros de apoio da concessionária. As vítimas foram encaminhadas para diversas Unidades de Saúde da região. A causa do acidente, naquele primeiro momento, era desconhecida. Diversas pessoas foram ouvidas na data do acidente e nos dias que se seguiram. Foi possível apurar que o referido ônibus seguia em direção ao estado do Ceará.
Ainda, que o ônibus não possuía cadastro nos órgãos responsáveis para fazer esse tipo de viagem. Descobriu-se, também, que os passageiros que iam de São Paulo para o Ceará foram captados via agências clandestinas de viagem. No total eram 33 pessoas no ônibus, contando com os motoristas. Os passageiros que prestaram depoimento apresentaram versões conflitantes quanto ao estado de conservação do ônibus. Alguns afirmaram que o ônibus apresentava boas condições e outros que o ônibus estava com pneus sem ranhuras, em estado de conservação duvidoso.
Ainda, disseram que não havia superlotação (cada passageiro ia em uma poltrona) e que não estava em alta velocidade quando do capotamento. Mas um ocupante narrou que no momento do acidente ninguém usava cinto de segurança.
Durante as investigações um dos motoristas prestou depoimento, se apresentando voluntariamente. Na época esclareceu que era o dono e motorista do ônibus acidentado. Confirmou que o ônibus não possuía cadastro nos órgãos responsáveis. Ainda, disse que, apesar de ser habilitado na categoria “d” (que segundo o artigo 143, inciso IV do CTB é a categoria exigida ao condutor de veículo motorizado utilizado no transporte de passageiros, cuja lotação exceda a oito lugares, excluído o do motorista), o documento estava vencido desde 13/05/2019. Com relação à viagem, esclareceu que além de ser dono e motorista, também era agenciador, mas que do total de passageiros apenas três eram de sua agência clandestina.
O veículo conforme destacou, saiu de São Paulo no dia 17/07, às 7 da manhã e que já tinha realizado paradas em Jundiaí e Americana para embarcar passageiros. Com relação ao estado do ônibus afirmou que o veículo não vinha apresentando problemas nas últimas semanas. Ainda, que na semana antes de realizar a viagem, fez uma revisão com um mecânico. Que ao sair de Rio Claro, logo após o pedágio, o ônibus superaqueceu, sendo necessária parada para resfriar o ônibus e colocar água no radiador. Nessa parada também apertou a correia que gira a ventoinha da polia viscosa. Após os reparos e sentindo segurança para continuar, seguiu viagem.
Com relação especificamente ao momento do acidente, o dono narrou que pouco depois dos reparos ele ouviu um forte estralo no painel do veículo, perdendo na sequência o controle do ônibus. Como estava em uma curva o ônibus acabou indo para a ribanceira, ali capotando. Confirmou a versão dos passageiros de que o veículo estava em velocidade compatível (mais ou menos 70km/h). Continuou dizendo que foi arremessado para fora do ônibus e que permaneceu por cerca de 15 minutos deitado. Após, se levantou e, com medo, entrou no ônibus que vinha na sequência (de um conhecido seu e que também fazia a rota São Paulo – Ceará), sendo deixado em um posto e depois seguindo para outro.
Declarou, também, que se lesionou com o acidente e que não tinha condições de ajudar os demais passageiros. Por fim, disse que todas as poltronas eram equipadas com cinto de segurança. Realizado laudo pericial. De início o veículo apresentava danos generalizados característicos de capotamento. O sistema de freios se apresentava articulado e o sistema elétrico não foi testado em razão do estado do veículo. Com relação ao tacógrafo, apresentava-se danificado e não havia indícios de que os danos foram causados pelo acidente.
O exame do veículo, após o capotamento, revelou fratura em uma das peças do sistema de direção. A peça em questão tratava-se de um alavanca pertencente ao sistema que transmite os movimentos do volante do veículo às suas rodas. Conhecida como barra de alívio ou ‘steering intermediate arm’, a alavanca prendia-se a um pivô, seu ponto de apoio, e soltou-se por fratura deste pivô. Esse dano provoca a perda de controle de direção do veículo, uma vez que os movimentos do volante deixam de ser transmitidos de maneira adequada às rodas dianteiras. Assim, em uma linguagem menos técnica, a barra de direção quebrou, ocasionando o acidente.
Após depoimentos de testemunhas e a perícia no veículo para identificar a causa do acidente, iniciou-se apuração sobre o veículo em si. Laudo apontou irregularidades nos chassis.
INVESTIGAÇÃO SOBRE O ÔNIBUS
Após depoimentos de testemunhas e a perícia no veículo para identificar a causa do acidente, iniciou-se apuração sobre o veículo em si. Laudo do Instituto de Criminalística apontou irregularidades nos chassis. Na parte de superior da longarina esquerda foi vista uma numeração de série. Já na parte superior do terço esquerdo da travessa traseira, foi vista uma numeração de série parcial. Ante a incompatibilidade das numerações, procedeu-se pesquisas. Descobriu-se que o primeiro chassi pertence a um Mercedez Benz/ Busscar Jum Bus do ano 2000, com placas JZB9262 (as mesmas que o ônibus acidentado ostentava). Já o chassi parcial é a parte final de outro chassi que pertence a um Mercedez Benz/0 400 RSD PL do ano 1994, com placas ICL8813. Ocorre que o ônibus placas ICL8813 se acidentou, em 2006, no Peru, matando 4 brasileiros que cursavam medicina e iam para o Fórum Social Mundial na Venezuela.
Por Janaina Moro / Foto: Divulgação