Tentamos adivinhar os desejos de quem gostamos apenas para poder atender a nosso desejo fundamental: o de ser aceito. Ser desejado pelo outro é nosso principal desejo.
E na maioria das vezes, para atender a essa necessidade do ego você já rifou seus gostos, abandonou hábitos de que gostava ou mesmo rompeu com seus princípios, fingindo ser outra pessoa. “Rompi com o mundo, queimei meus navios…”, diz a bela música do Chico Buarque.
Nos acostumamos fácil a pessoas, trabalhos e situações do dia a dia que muitas vezes nos ferem. E a dificuldade em encarar uma mudança vem de autojustificativas, ou interesse, por uma dependência psicológica ou até mesmo por uma incapacidade de sair da inércia. Ou mesmo por não haver nenhuma perspectiva palpável num horizonte próximo.
Muitas vezes há tantas máscaras e tanta “maquiagem” encobrindo o eu verdadeiro, que a pessoa acaba sofrendo sem saber.
Com pouca vida interior vamos, aos poucos, enquanto crescemos, sem perceber, nos tornando reféns das coisas exteriores. Assim muitos de nós temos sempre na ponta da língua uma justificativa para a passividade diante de um comportamento abusivo. Sempre uma justificativa que muitas vezes tira a culpa do outro e ameniza a situação abusiva.
A gente acredita sempre na bobagem de que somos autônomos, que somos donos do nosso nariz e ninguém pode dar palpites em nossa vida. Mas a verdade é que nunca estivemos tão inseguros. Vivemos procurando sempre alguém que cuide de nós, e muita gente se contenta até com quem cuida muito mal. Somos tão adultos nos afazeres do dia a dia, mas emocionalmente, somos crianças.
Por que será que a gente é assim? Por que será que, ao menor sinal de incerteza, nossa tendência é correr para a zona de conforto e abraçar aquilo que nos dê uma garantia, mesmo sabendo que podemos ser mais na vida?
Consumimos produtos e marcas numa inútil fantasia de construção de uma felicidade que só dura o tempo da experiência de comprar. Mergulhamos na experiência condicionada do consumo buscando uma felicidade que nunca chega. Também nos cercamos de produtos na tentativa de construir nossa identidade perante os outros.
É o que diz o sociólogo Steve Miles: “Consumismo é consumir mais do que realmente precisamos, consumir pelo tédio, para aplacar a ansiedade, consumir procurando uma felicidade que nunca chega”. Ao consumo é atribuída uma série de atributos que ele não tem.
Numa época em que o mais importante para aparecer basta parecer, fingimos o tempo todo. Não é à toa que temos as telas como nossas maiores companheiras. E desse meio surge a pergunta: “Como está sua vida fora dos stories?”
Da televisão, do computador, do celular, as telas estão por toda parte,oferecendo a perspectiva de um mundo mais interessante que o nosso, esvaziado de sentido. Alguém que nasceu já há um bom tempo e enxerga com os olhos do mundo passado fica chocado com nossa total falta de resistência aos problemas que a vida apresenta a alguns de nós.
Vamos vivendo como crianças em uma loja cheia de brinquedos sem saber o que escolher, pois a cada escolha vivemos com a angústia de que outra escolha diferente poderia ter sido melhor.
Lidamos muito mal com a incerteza, com a capacidade de nos mantermos. E as frustrações de pequeno prazo, por menores que sejam, são um verdadeiro terror. Cada vez menos nos permitimos deixar de fazer algo agora para colher os frutos lá na frente.
Numa confusão absurda, o mesmo mundo que te diz que economizar é muito importante, te grita que você deve gastar.
E vamos acreditando em mentiras, autojustificativas que nos servem de travesseiro na tal zona de conforto. A culpa por não fazer aquilo que se quer está sempre nos outros, no mundo, nunca em nós mesmos.