Nosso dia a dia está tão acelerado pela tecnologia que a impressão é a de que o mundo virou um trem em alta velocidade, e que nem para mais na estação. Quem quiser embarcar precisa pular pra dentro do trem. Do contrário, podemos nos condenar a ficar perambulando por aí, meio sem entender o que está acontecendo e dizendo pelos cantos: “o mundo está no fim” ou, ainda, “o mundo está perdido”. Só que não.
Antes de sair por aí julgando, é bom tentar entender. E ‘para entender, tem que se achar’ nesse mundo 4.0, desbussolado. Um bom guia é o festejado Yuval Noah Harari. Doutor em História pela Universidade de Oxford, especializado na História do Mundo e autor, do livro “Cartas para o século 21” e os outros dois “Homo Deus, Uma Breve História do Amanhã” e “Sapiens, Uma Breve História da Espécie Humana”.
Ao final de Homo Deus, o autor convida o leitor a pensar sobre o fato de que “a “ciência está convergindo para um dogma abrangente, que diz que os organismos são algoritmos e a vida é o processamento de dados”.
De acordo com o dataísmo, o que geralmente chamamos de sentimentos e desejos são, na verdade, algoritmos bioquímicos. “Os sentimentos não são baseados em intuição ou inspiração. Eles são baseados em cálculos”, afirma Yuval, provocador.
E ele exemplifica explicando que quando um babuíno, girafa ou humano vê um leão, o medo surge porque milhões de neurônios no cérebro calculam os dados relevantes e concluem que a probabilidade de morte é alta.
Há ainda outros processos de convergência que são igualmente importantes no mundo. Da convergência entre a biotecnologia e a tecnologia da informação, há ainda os avanços da engenharia genética e da inteligência artificial. E elas não estão separadas, se juntam.
A essência dessa revolução é a fusão da biotecnologia com a infotecnologia. Assim, “hackear” os algoritmos bioquímicos dos organismos será a chave tanto para reprogramar esses organismos (com engenharia genética) quanto para capacitar a inteligência artificial.
Quanto mais poder de computação tivermos, mais fácil será analisar padrões biológicos e aprender a diagnosticar doenças e identificar padrões emocionais. Essas habilidades, por sua vez, possibilitarão que uma máquina dotada de inteligência artificial trate doenças humanas, identifique terroristas humanos, recomende companheiros humanos e navegue por uma rua cheia de pedestres humanos.
“No próximo século, poderemos ganhar o controle do mundo dentro de nós e remodelar nossos corpos e cérebros, mas, como não entendemos a complexidade de nossas próprias mentes, as mudanças que faremos podem perturbar inadvertidamente todo o nosso sistema mental”, acrescenta Yuval.
Trocando em miúdos, o que Yuval recomenda, mesmo diante de tantos avanços, é aquilo que nosso bom poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade já dizia do ser humano em seu poema “O Homem, As Viagens”: “a dificílima dangerosíssima viagem de si a si mesmo: pôr o pé no chão/do seu coração/experimentar/colonizar/civilizar/humanizar o homem/descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas/ a perene, insuspeitada alegria/de con-viver.” Por isso, está em nossas mãos pular ou não para dentro desse “trem” mundo, e embarcar para não ficar para trás.