Atleta, técnica e apaixonada pelo esporte. É como pode ser definida Carmem Carolina. Nascida na periferia de Londrina, no Paraná, a atleta começou no esporte em um projeto social e, após uma trajetória de sucesso no taekwondo, acreditou no potencial transformador do esporte e optou por desenvolve projetos esportivos para jovens em Rio Claro. Com duas Olimpíadas na bagagem e formando atletas olímpicos, Carmem conversou com o Diário do Rio Claro, quando falou sobre sua história no esporte, os bastidores das Olimpíadas e o potencial transformador do esporte para a vida dos jovens.
Foi na periferia de Londrina que Carmem, aos 12 anos, descobriu o taekwondo. “Eu ia acompanhar meu irmão nas aulas de um projeto social e para não ficar só assistindo, comecei a praticar. Na minha primeira competição eu perdi e para não perder de novo, comecei a treinar duro e aí começou a questão da competitividade”, conta a atleta.
A ascensão foi rápida, três anos depois das primeiras aulas, Carmem já estava na Seleção Brasileira Juvenil. “O Campeonato Mundial Junior seria na Espanha e eu só consegui o dinheiro para a passagem no dia do embarque”, relembra, contando que continuou na Seleção Juvenil e ingressou na categoria adulta aos 17 anos. “Por oito anos fui titular na seleção adulta e, aos 19 anos, fui para a minha primeira Olimpíada.”
Em 2000, Olimpíadas de Sidney, Carmem foi a primeira representante brasileira da modalidade nos Jogos. “Eu lembro que eu era a última opção, ninguém esperava que eu fosse conseguir. Lembro que a Folha de São Paulo fez uma matéria com o título Ex-patinho feio vai para as Olimpíadas. Dos quatro atletas da Seleção, apenas eu classifiquei e era a única que não tinha chances. Fui sozinha e eu era muito nova, fiquei no alojamento junto do Gustavo Kuerten e da Maurren Maggi.”
Nessa época, Carmem já havia se mudado para São Paulo para treinar. “Foi um período maravilhoso, que foi desde andar nas ruas e dar autógrafos, até participar de eventos. Estive no Criança Esperança com o Didi, estive próxima de atores globais Tony Ramos e Vera Vischer. Esse período foi muito emocionante. Estar nas Olimpíadas é maravilhoso.”
Em sua primeira Olimpíada, Carmem acabou perdendo para a favorita, representante da Itália. “Era uma época que não existia o colete eletrônico e eu até fui bem, perde de 7 a 5. Fiquei feliz com o resultado e tudo que vivenciei. Naquele ano ganhei o prêmio de Melhor Atleta do Comitê Olímpico.”
Nas Olimpíadas de 2004, uma grande decepção. “Diferente de Sidney, dessa vez eu era a favorita, mas não consegui me classificar. Fiquei muito decepcionada. Entrei em depressão e me desliguei da Seleção. Me mudei para Londres, onde acabei dando aulas de taekwondo para crianças. Quem me convidou para dar as aulas foi o Edmilson Filho, que era da seleção junto comigo, hoje ele é um ator/comediante famoso. Foi na Inglaterra que tive minha filha.”
RIO CLARO
Com vontade de retornar para o Brasil, surgiu a possibilidade de vir para Rio Claro. “Ia acontecer os Jogos Regionais em Rio Claro, era 2008, e o prefeito queria ter representante em todas as modalidades. Foi então que surgiu o convite para que eu montasse uma equipe para os jogos daquele ano. Eu disputei os Jogos, inclusive, contratei para lutar o Nichollas, que hoje é meu marido.”
Com o fim dos Jogos, Carmem acabou se apaixonando pela Cidade Azul e fixando residência. “Iniciei um projeto esportivo dentro da escola Antonio Maria Marrotte. Dali desse projeto já colocamos sete meninos na Seleção Brasileira. E foi ali que tudo começou, fizemos uma família.”
Com cerca de 300 alunos, a Academia Pro Team continua desenvolvendo projetos sociais em Rio Claro, além de treinar atletas de alto rendimento. “Muitos atletas que querem entrar para a Seleção acabam vindo para cá, para treinar e hoje a Academia Pro Team tem três atletas entre os dez melhores do mundo: Netinho Marques (6º) [hoje nas Olimpíadas], Talisca Reis (8º) e Valéria Rodrigues (10º).”
SELEÇÃO
Apesar de estar em Rio Claro e seguir com os projetos, Carmem não abandonou a Seleção. Em 2010, entrou como técnica da Seleção Brasileira, deveria ter ido às Olimpíadas de 2012, porém deu sua vaga para o preparador físico. E retornou às Olimpíadas em 2016, como a primeira técnica mulher no taekwondo. Agora, em 2020, não está nos Jogos, porém um de seus atletas leva o nome da Academia Pro Team em destaque, Netinho Marques.
“Todo atleta sonha com os Jogos e na verdade é a realização não só pessoal, mas de um trabalho, de toda a equipe. Por isso vem muita responsabilidade, pois você está representando o seu País, todos torcendo por você, a pressão é grande. Hoje as pessoas são muito maldosas, naquela época eram mais boazinhas, mesmo que a gente perdesse tinha um apoio. É uma experiência única, mas você precisa abrir mão de muita coisa. Apesar de ser gostoso é estressante, as pessoas esperam algo da gente.”
ESPORTE
Apesar do trabalho com o esporte alto rendimento, Carmem diz priorizar a base esportiva, acreditando no poder transformador do esporte. “Eu sou a prova disso. Conheço 38 países, comecei em um bairro de periferia e não teria condições nenhuma de conseguir isso sem o esporte. Por isso hoje com os meninos da Academia, nós fazemos acontecer, fazemos rifa, pedágio, o que for preciso para participar dos campeonatos. Temos histórias lindas de meninos e meninas que passaram pelo projeto e que puderam fazer uma faculdade e até mesmo estar na Seleção.”
Carmem acredita que nas próximas Olimpíadas, Rio Claro poderá ter mais atletas na modalidade. “Os meninos que começaram no projeto lá no Marrotte vão estar com idade para disputa em 2024”, declara, ressaltando que a sua filha Julia, de 16 anos, é uma das apostas. “Ela começou a treinar e em três meses já estava entre as três melhores do Brasil na categoria dela e já está na Seleção juvenil, ela chegou antes que eu, eu fui para a Seleção aos 15, ela chegou com 13”, conclui. A Academia Pro Team tem o apoio do Instituto Crescer no Esporte, Prefeitura de Rio Claro, Grupo Ginástico e Marli e Tavares Imóveis.
CARMEN CAROLINA
Carmen Carolina foi a primeira atleta brasileira do taekwondo a disputar os Jogos Olímpicos, em 8 anos como titular da seleção brasileira, foi eleita a melhor atleta da modalidade pelo COB em 2000, bi-campeã dos Jogos Sul-americanos, Campeã da Seletiva Olímpica Pan-americana e bronze na Copa do Mundo. Ingressou na Comissão Técnica da CBTKD em 2010 após indicação do Grão Mestre Flávio Bang (que já foi Diretor Técnico da CBTKD, hoje é o Coordenador do Para-Taekwondo da CBTKD), em 2011 e 2015 foi chefe da delegação nos Jogos Pan-americanos e vem desenvolvendo um excelente trabalho também em sua academia, Pro Team Rio Claro, filiada da FESPT, onde atualmente possui dois atletas na seleção brasileira.
Por Vivian Guilherme / Foto: Divulgação