A maior vingança contra o tempo que nos envelhece, é a memória. Conseguir lembrar com alegria do que se viveu, do quanto se foi feliz, do quanto amou e foi amado, independe da passagem do tempo.
Aí vem o tempo, que não se dá por vencido e, num duro contra-ataque, nos faz perder a memória, ou ainda nos mata. Mas eis que a memória, triunfante, imaterial e impalpável, migra e passa a viver na mente das pessoas que nos amavam.
Toda literatura, toda arte e ciência que empreendemos são constantes construções de memórias. Acha que nosso Machado de Assis, por exemplo, não sabia que com o que escrevia se tornaria imortal?
Somos em nossa essência um apanhado de memórias e promessas de futuras lembranças, alegres ou tristes, amargas ou doces.
Podemos viver, sem nenhuma morbidez nisso, alimentado pelo sentimento de que um dia seremos apenas algumas fotos imperfeitas daquilo que fomos, perdidas em arquivos de um celular antigo, no fundo de uma gaveta, ou mesmo em algum servidor nalguma nuvem.
Se você andar pelos cantos mais aos fundos de qualquer cemitério vai perceber alguns túmulos, antigos, empoeirados, pouco cuidados, e constatar que há muitos anos não são visitados por ninguém. Até mesmo algumas placas com os nomes já nem mais estão por lá.
Sim, seremos esquecidos um dia, por obra implacável do tempo. Então o que queremos ser e fazer antes que nos esqueçam completamente? Que memórias de prazo médio queremos deixar, para quando não estivermos mais por aqui?
E por tudo isso, de que adianta todo esse deslumbramento com a ilusão do poder, do dinheiro, da vaidade?
O real poder que nós temos nessa curta passagem aqui pela Terra é o de nos libertarmos do tempo, em memórias eternas, em amor que dedicamos aos outros.
Como nos belos versos de Aldir Blanc, hoje memória, na linda voz de Nana Caymmi: “E o tempo se rói/Com inveja de mim/Me vigia querendo aprender/Como eu morro de amor/Pra tentar reviver.”