Nunca fui chegado em Carnaval. Mas trago algumas boas recordações do evento, entre elas, as noites de domingo, durante a minha infância, que passava com minha mãe, diante da tevê Philco 24 polegadas, assistindo aos desfiles das escolas de samba do Rio de Janeiro. Refiro-me a qualquer coisa como 1977, 8, 9, 80, 81, por aí.
As transmissões eram toscas, se comparadas às de hoje. Poucas câmeras, geralmente estáticas, poucos comentários, e ouvia-se aquela batida gostosa do samba, que, com o passar dos anos se perdeu.
Tinha aquele narrador da TV Globo, com voz de locutor de rádio (refiro-me aos bons tempos do rádio, evidentemente), acho que o nome dele era Heron. Heron Domingues, salvo engano. Ah, já naquele tempo, tinha o Léo Batista, acredite!
As alegorias eram monumentais. Para os padrões da época, bem entendido. Os destaques, que geralmente ficavam lá no alto das alegorias enormes, chamavam a atenção e eram aguardados com expectativa, pelas madames e moçoilas, que assistiam ao evento com os olhos grudados na tevê.
Teve um destaque que, certa vez, caiu lá de cima, uma tragédia! Seu nome, Mauro Rosas, destaque da Unidos de São Carlos. Foi em 1980. E como resultado, nove costelas quebradas e um pulmão perfurado. Mas, logo ele se recuperou, e continuou a exibir suas plumas e paetês, ao lado do Clóvis Bornay e do Evandro de Castro Lima, seus rivais nos concursos de fantasias dos mais refinados clubes e hotéis da high society carioca, que, Ibrahim Sued, descrevia tão bem em sua comentada coluna social.
Lembro também, das edições especiais da extinta revista Manchete, que traziam a cobertura completa do carnaval carioca, o melhor do Brasil, naqueles dias. Esgotava nas bancas logo pela manhã.
Por aqui, em Rio Claro, tinha as gostosas matinês do Grêmio Recreativo da Cia Paulista (nos seus bons tempos), que eu ia, acompanhando meu irmão Carlão e a cunhada Lila. E lá encontrava, geralmente, o primo Décio, e alguns amigos, da rua onde eu morava, e da escola, não posso aqui dizer onde eu estudava, porque, precisamente, não é o caso.
O corso, porque assim era chamado o desfile das escolas de samba, de antigamente, acontecia, em Rio Claro, na área central da cidade, em torno do Jardim Público. Festa do povo, feita para o povo. A turma se ajeitava, fosse de pé, na guia da calçada, se espremendo todo atrás das cordas, fosse sentado nas cadeiras, que alguns mais espertos traziam de casa.
E era bacana. Porque havia, quase sempre, uma demora muito grande, entre o desfile de uma escola e outra, então, ficava aquela expectativa, que era sempre correspondida, pelas escolas, que mandavam bem, com seus poucos recursos, mas, muito colorido, criatividade, samba no pé, e uma bateria, que quando passava perto da gente, fazia o coração estremecer e acelerar, envolvendo a todos numa vibração contagiante e inesquecível. Turma boa aqueles ritmistas e passistas!
Entre as escolas de samba, tinha o desfile dos carros alegóricos dos clubes sociais da cidade, e, é claro, de sua majestade, o rei Momo. E, nessas horas, a criançada mais abusada, invadia a rua, pra tentar apanhar a tão desejada serpentina que era atirada pelas lindas princesas, sempre sorridentes e solícitas.
Aí, a gente cresce, o tempo passa, as coisas mudam. Em outra crônica, escrevo sobre os bailes de carnaval à noite, que passei a frequentar, a partir dos 14 anos, que era a idade que o sempre rigoroso Juizado de Menores estabelecia. Mas acho que isso daria um conto, ao invés de uma crônica. Vamos ver, quem sabe.
Atualmente, ao menos em Rio Claro, o Carnaval como o conhecemos na infância acabou, e com ele, a alegria que tomava conta da cidade naqueles quatro dias e quatro noites de folia.
Nada a estranhar. A sociedade humana é assim. Sucedem-se as gerações, mudam-se os interesses, os hábitos e os costumes. Brasileiro tem algo de bom, que é não arrastar defunto, ao longo de décadas e séculos, como fazem os europeus. O que está no passado, morto está, e que lá permaneça, na forma de lembranças. Algumas, valem a pena recordar, como o Carnaval que eu conheci na minha infância.