Chamada de “Desafio da Rasteira” ou quebra-crânio, a ação se tornou viral nas redes sociais, mas muito pelo contrário da animação dos que aderiram e fizeram o desafio, a nova “brincadeira”, que na verdade não deve ser chamada assim, gerou também indignação e preocupação por parte de profissionais, já que, além de diversos riscos, pode até levar à morte.
O desafio envolve três pessoas que ficam lado a lado. Enquanto as duas dos cantos pulam e passam uma rasteira na do meio, que não está ciente da ação e sofre a queda. Diversos vídeos circularam pela internet. Em um deles, gravado em colégio na Venezuela, um estudante cai e bate a cabeça violentamente no chão.
Doutor Renato Romera Natalino, médico neurologista e neurofisiologista clínico, conversou com equipe do Diário do Rio Claro, salientando os riscos da “brincadeira”. “Conceitualmente, toda queda com consequente contusão de alguma parte do corpo é considerada trauma. Os traumas podem ter variados graus de energia, desde menor energia, como, por exemplo, a maioria dos casos de queda da própria altura, o que acontece na brincadeira, como de maior energia, por exemplo, em acidentes automobilísticos de alta velocidade”, destacou.
O especialista observa que, quanto maior o grau de energia, maiores as chances de o indivíduo sofrer uma lesão, entretanto, até os de baixo grau de energia podem levar a sérias consequências. “Por exemplo, uma lesão da coluna pode ocorrer como consequência de queda da própria altura (embora não seja frequente) e se complicar como uma compressão de estruturas nervosas ou da medula espinhal, podendo levar à paraplegia, tetraplegia, dificuldade na continência da urina, dor aguda e crônica, etc”, salientou.
O médico alerta que, além de todas as complicações mencionadas, a “brincadeira” pode até levar à morte. “Um sangramento intracraniano pode levar à dificuldade para mover um lado do corpo, sequelas cognitivas, incoordenação, convulsão, dentre muitos outros sintomas debilitantes e, inclusive, cursar com morte, caso o sangramento seja volumoso e não abordado rapidamente”, esclareceu.
Sem contar as inúmeras fraturas ósseas, lesões musculares, articulares, sangramentos intra-abdominais, que podem ocorrer em qualquer tipo de trauma, citando apenas algumas das consequências de traumas.
O Diário do Rio Claro consultou também a Professora Dra. Lúcia Helena Hebling Almeida, psicóloga clínica, autora de artigos e livros, Profa. Convidada da UNICAMP (Campinas) e UNIMES (Santos) para avaliar o comportamento de jovens que acabam se influenciando. “Sabemos que o período da adolescência se configura como uma situação-limite, um período emocionalmente turbulento. Os adolescentes, na sua maioria, são capazes de pensar de forma abstrata, dedutiva e hipotética e de se colocar no lugar do outro, percebendo que diferentes pessoas podem ter pontos de vista distintos diante de uma mesma situação – mas, nem sempre respeitam isso – por isso, temos visto tanta intolerância e agressividade nos grupos desta idade também”, observou a profissional.
A psicóloga destaca que mudanças repentinas e imprevisíveis de humor e agressividade são frequentes; na maioria das vezes, representam a insegurança e a ansiedade diante de situações novas, de dúvidas e das transformações que enfrentam. “O agir por impulso é uma característica desta fase, pois o córtex pré-frontal ainda não amadureceu, o que faz com que os jovens nem sempre consigam ponderar os riscos e benefícios de seus atos, têm dificuldades de controle inibitório, de planejamento e tomada de decisão”, salientou.
A brincadeira tem sido tema e alerta nos últimos dias. “O filósofo Mário Sérgio Cortella assinalou-a como “uma brincadeira besta”, no sentido – do ignorante, animal, incapaz de pensar nas sérias consequências e sequelas que pode gerar. Fora o desrespeito ao outro, ao colega agredido; isto é, por ser um período de turbulência emocional, nem sempre o adolescente, o jovem, consegue ter real maturidade para perceber a gravidade do que está fazendo”, destacou a especialista.
A psicóloga Lúcia Helena Hebling Almeida alerta que a aproximação dos pais de seus filhos é de extrema importância e pode fazer a diferença. “Conversar, perguntar se estão recebendo este vídeo, se viram tal brincadeira ou semelhante, se viram amigos ou outros grupos praticando tal ‘brincadeira besta’ para poder entender como o filho se posiciona e, a partir daí, orientá-lo sobre os riscos, sobre humilhação, sobre respeito, sobre ajudar o outro, sobre se colocar no lugar do outro, é fundamental”, mencionou.
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