As queimadas na Amazônia foram politicamente boas para todos os lados: o presidente francês Macron se mostrou preocupado com a floresta, com a ecologia, e ganhou também com a grosseria de Bolsonaro, que foi atingir a primeira-dama da França; e Bolsonaro, que comprovou ter apoio de Trump, e obteve também o suporte de Japão, Canadá, Alemanha, Inglaterra. De certa forma ganhou o Brasil, já que a política de preservação da Amazônia acabou entrando em discussão, prós e contras. Mas que Bolsonaro não permita que a fumaça da Amazônia prejudique sua visão política: tem a popularidade em baixa, e o motivo, obviamente, não é queimada nenhuma.
É a economia.
Estão no forno algumas reformas importantes, mas nenhuma tem efeito imediato no que importa: na baixa do desemprego, no desenvolvimento, no aumento do poder de compra. Há muito menos gente interessada na floresta do que nas contas a pagar, no emprego, nas necessidades da família.
Por isso a pesquisa da Confederação Nacional de Transportes, CNT, está tão ruim para o Governo: Bolsonaro é avaliado como ruim ou péssimo por 39,5% dos pesquisados, enquanto 29,4% o consideram bom ou ótimo. Se os índices são ruins, ficam piores quando se nota que estão em queda. Em fevereiro, 39% o avaliavam como bom ou ótimo. Velhos tempos, belos dias.
Brigas internas, insultos externos, embaixador chamando o presidente de meu paipai, tudo é teatro. Mas quem vota é o bolso. A Argentina é o exemplo.
Quem diria
A imprensa europeia mostrou uma jovem que, estarrecida pelo incêndio, foi à Amazônia e salvou uma girafa, bicho que ali nunca houve. Bolsonaro criticou a Noruega num vídeo que mostrava a caça de baleia por dinamarqueses. Macron disse que a Amazônia é o pulmão do mundo (não é: plantas adultas consomem o oxigênio que geram). Para Bolsonaro, a menos que se reduzam reservas indígenas e quilombolas, e áreas de preservação, não haverá espaço para a agropecuária. Haverá: o Projeto Jari, monumental, preserva 90% da mata, é produtivo e dá lucro. A Alemanha protesta contra o incêndio, mas uma indústria pertencente ao Governo alemão, a Volkswagen, promoveu há tempos o que chamou, em anúncios, de “a maior queimada da História”, na Amazônia, em sua Fazenda do Vale Cristalino. Uma empresa cujo capital é 30% da Noruega, a Norsk Hydro, tem na Amazõnia uma imensa jazida de bauxita, que só poderá explorar se tirar a floresta de cima.
Brasil brasileiro
Há anos, o Incra leiloou terras na Amazônia. Os vencedores investiram para cercar as terras, instalar-se, aí veio a Funai e os tocou de lá, porque era região de índios. Cadê os índios? Eram poucas dezenas, chefiados pelo cacique Manuel. Se eram poucos, por que tanta terra? Os índios perambulavam, disse a Funai. Bom, este colunista fez as contas: andando dia e noite, a tribo levaria seis meses para ir de uma ponta a outra da reserva. E quem comprou a terra do Governo, pagou e investiu? Talvez pudesse recorrer ao papa, porque a lei vedava saídas judiciais. Como a reportagem foi publicada, o Incra ofereceu aos vencedores do leilão terras de valor equivalente, em outro local. E toca a fazer o investimento de novo, gastando mais tempo e mais dinheiro. Segurança jurídica? A expressão é bonita.
A verdade, enfim
Falou-se muita bobagem – como atribuir a atual queimada a uma só causa, quando a Amazônia brasileira é do tamanho da União Europeia. Há várias causas: a seca própria da época; queima dos rejeitos da colheita; o crime, que desmata para criar fazendas clandestinas, ou ampliar fazendas (legais) já existentes. E os malucos: o grupo paraense Sertão (este a Polícia deve pegar), combinou por WhatsApp provocar incêndios no Dia do Fogo, 10 de agosto, para ocupar uma reserva florestal de 1,3 milhão de hectares. Contrataram motoqueiros para botar fogo no capim seco à beira das estradas e operadores de motosserras para que nada sobrasse. No grupo há garimpeiros, grileiros, fazendeiros interessados em expansão, gente da cidade que quer virar fazendeiro sem se dar ao trabalho de comprar terra. Talvez haja também fanáticos políticos, como os que encheram de pragas os cacaueiros baianos. A culpa só é do Governo porque passou uma ideia errada, de que não era lá muito importante preservar o meio-ambiente. Isso acabou no liberou geral.
Atenção
Fique atento aos movimentos do ministro da Justiça, Sérgio Moro: apesar da pesada campanha contra ele, da troca de mensagens com os procuradores, do mau gosto de tantas mensagens (como ridicularizar o luto de Lula pela morte de seu irmão, de sua esposa, de seu sobrinho – que coisa feia!), apesar de estar no Governo apenas decorativamente, Moro continua sendo o mais popular dos ministros. Talvez espere ir para o Supremo (embora não seja, como quer Bolsonaro, “terrivelmente evangélico”). Mas, se não for, pode sair candidato à Presidência, com Bolsonaro ou contra Bolsonaro. Ainda falta tempo, talvez até lá ele se enfraqueça. Mas hoje é um nome de peso
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