A análise do relatório final do Projeto de Lei Escola Sem Partido, que tramita na Câmara dos Deputados, foi agendada para terça-feira (13). A comissão especial que analisa o PL adiou a discussão que aconteceria na última quarta-feira (7) e que pretendia discutir o parecer do deputado Flavinho (PSC-SP).
A proposta, que pretende limitar o que os professores podem falar nas escolas, proíbe abordagens de identidade de gênero na educação. O texto obriga ainda as instituições de ensino afixarem cartaz definindo deveres do professor em salas de aulas.
ANÁLISE
O membro da Comissão da Infância, Juventude e Adoção da OAB Rio Claro, Peterson Santilli, analisou o Projeto de Lei que pretende limitar o que os professores falam em sala de aula. “Barrar a possibilidade do professor em abordar temas como filosofia, sociedade, sexo, religião, política e etc., inibe a possibilidade dessas crianças e adolescentes serem formadores de opinião, restando-lhe a aprendizagem apenas e exclusiva do que vem na cartilha. É valorizar o professor ruim, que vai ter o seu trabalho simplificado, já que suas aulas serão padronizadas, enquanto o professor que se preocupa com o desenvolvimento intelectual, moral e social do aluno vai ser desprestigiado e, consequentemente, até punido, como já vimos acontecer”, analisa.
CONCEITOS
Ele argumenta que o fato de professores apresentarem outras vertentes religiosas e morais não tira o direito dos pais de conduzirem o ensinamento aos filhos. “Apenas introduz conceitos e fatos históricos, apresentados por vários prismas, inclusive, aquele diverso dos pais e até dos próprios educadores”, esclarece.
O advogado cita ainda o artigo 227 da Constituição que estabelece que é obrigação de todos, família, sociedade e Estado, assegurar à criança e ao adolescente o acesso à educação. “Além de colocá-los a salvo de toda forma de discriminação. E a única forma que temos para combater a discriminação é a informação plural e plena”, diz.
PROJETO
O texto substitutivo do Projeto de Lei defende respeito às convicções dos alunos, de seus pais ou responsáveis, dando preferência aos valores de ordem familiar sobre a educação. Questionado se a redação não descaracteriza a função social da escola, Santilli foi enfático: “a escola é o local onde a criança vai ser submetida a vivencias diferentes que ela até então teve dentro da sua família, será exposta ao diferente, ao novo, ao conhecimento, à cultura, hábitos e costumes diversos, e é neste ambiente plural, juntamente com a educação moral e religiosa fornecida pela família, que este indivíduo em desenvolvimento vai começar a se formar como cidadão”.
CARTAZES
Sobre a afixação de cartazes nas instituições educacionais, Santilli vê como prejudicial ao ambiente acadêmico. “Trata-se de medida extremamente danosa ao ambiente acadêmico.
O advogado ressalta que os argumentos de quem defende a proposta estão pautados no que dispõe o inciso IV do artigo 12 da Convenção Americana de Direitos Humanos. “A Constituição já garante isso, a educação formal e técnica fornecida pelo Estado, não adentra em questões religiosas e de ordem moral, mas sim introduz conceitos e informações necessárias para que a criança e o adolescente também tenham o seu direito à opinião de qualquer natureza respeitado, conforme preconizado no artigo 1º da própria Convenção Americana de Direitos Humanos”, atenta.
MOVIMENTO
No país, diversas escolas já aderiram ao movimento Escola sem Partido, mesmo sem a aprovação da lei. Inclusive, pais têm questionado e cobrado a revisão da bibliografia adotada por instituições de ensino por acreditarem que livros como “Meninos sem pátria”, de Luiz Puntel, lançado em 1981, ferem suas crenças políticas e religiosas.
Para Santilli, a participação familiar na vida acadêmica dos filhos é um direito. No entanto, ele reforça que esta participação não pode contrariar a grade curricular ou dificultar o trabalho do professor. “Entendo que o fato do projeto querer proibir que a criança ou adolescente tenha sequer o acesso a conceitos doutrinários e científicos, porque, em tese, contrariam o que eles entendem como certo, é violar o direito da criança e do adolescente ao acesso à informação e, consequentemente a sua opinião”, diz.